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Nada será como antes amanhã

No terceiro artigo da série, Júlia Ramalho Pinto reflete sobre a não-linearidade e o incompreensível como temas da saúde mental

Júlia Ramalho Pinto *

Tradicionalmente, a humanidade tem estudado a história, fatos e dados para gerar conhecimento, compreender o presente e prever o futuro. Aprendemos que as estações do ano são cíclicas e previsíveis, como se dá o desenvolvimento padrão de doenças e como somos capazes de aprender, etc. Dentre tantos outros conhecimentos, fomos estudando causas e efeitos, enquanto o nosso pensamento linear gerava explicação para fatos e antecipava o futuro.

Nossa sociedade foi se tornando cada vez mais complexa. Hoje, há uma infinidade de variáveis que se complementam e interagem, impactando nossa realidade. Não há dúvida de que, como cyborgues, seres humanos super poderosos, funcionando cada vez mais dependentes de tecnologias, fomos engendrando uma sociedade hiper tecnológica, com mudanças cada vez mais aceleradas e exponenciais. 

Neste cenário, não há como visualizarmos o futuro a partir de espelhos retrovisores. O futuro não é apenas a projeção do que aprendemos sobre o passado, mas se torna cada vez mais incerto e incompreensível. Assim, a não-linearidade e o incompreensível complementam o chamado mundo BANI -Brittle, Anxious, Non-linear, Incomprehensible, que começamos a descrever nos posts anteriores.

E o que podemos fazer diante dessas mudanças exponenciais? Como gerar sentido diante tantas transformações? 

Primeiro e antes de tudo, o autoconhecimento se torna crucial para navegarmos nesse mundo non-sense. Neste sentido, trata-se de uma jornada, uma busca e não um ponto de chegada. Existem tantas camadas de percepção pessoal que é praticamente impossível que consigamos um dia chegar ao que chamamos propriamente de autoconhecimento. 

Na Grécia antiga, em Delfos, foi registrado o aforismo que desafiava e continua desafiando a todos: “conhece-te a ti mesmo”. A mensagem, atribuída a Deus e transmitida por Apolo, representava a necessidade de se conhecer a verdade de si, para, só então, conhecer a verdade do mundo.  

O desafio do autoconhecimento

Para Sócrates e os gregos, o autoconhecimento passava por um processo de reconhecimento de nossa ignorância e desenvolvimento do processo racional. Mas, para além dessa racionalidade, a psicologia nos ajudou a compreender que somos seres psico-bio-socio-espirituais. Para lidarmos com o autoconhecimento, é preciso que reconheçamos como estas instâncias atuam em nós.

Isso significa que se conhecer é, antes de tudo, reconhecer o seu ponto de partida, então: localize-se!  identifique como cada uma dessas instâncias está influenciando o seu Ser.

A saber: 

Você conhece seu corpo? 

Quais sinais ele te dá de que está bem ou de que algo vai mal? Reconhecer os limites do corpo é fundamental para saber como navegar nesse mundo. Se somatizamos ou seja, trazemos para o corpo um desafio da mente, através de uma enxaqueca ou gastrite crônica, é possível que, por exemplo, algo contrário ao que você deseja esteja sendo vivido.

Você reconhece suas emoções? 

Muitas vezes necessitamos de espaço, pausa e escuta para sentir e reconhecer nossas emoções. Sem isso, passamos a reagir orientados por elas. No filme “Divertida Mente”, da Pixar, a tristeza precisava ser reconhecida para que se desse vazão à dor. Nenhuma emoção deve ser deixada de fora, nem mesmo a raiva, por exemplo. 

A raiva bem acolhida e reconhecida nos permite enxergar as expectativas e frustrações não ditas. A força da raiva também nos permite transformações e realizações. Reconhecer as emoções é fundamental para que possamos ser agentes e não reagentes da nossa vida.

Você reconhece seus sonhos e desejos? 

Freud foi de extrema importância para trazer esse tema. A sua teoria da psicanálise nos revelou o quanto somos guiados por desejos inconscientes. Reconhecer isso, e construir uma vida autêntica em torno de nosso desejo e não do que o outro e/ou da sociedade quer para nós, é uma tarefa desafiadora. 

Esse social está em nós antes mesmo de nascermos, está na história que é contada com nossa chegada. O social diz  do lugar que ocupamos em nossas famílias, e do lugar que nossas famílias ocupam num social ainda maior. Todas essas tramas e círculos sociais compõem e estruturam nossa personalidade, enquanto moldam nossos valores e crenças. Reconhecer nossa história é reconhecer o que foi feito de nós. É, a partir dessa história, perceber o mundo parcialmente.

Por fim, e não menos importante: sua alma tem fome de quê? 

Aqui dizemos sobre algo que transcende ao corpo e mente, transcende a razão, as emoções e a ancoragem do social. Para além da conversa dogmática da religião, o que te conecta e te expande?

Para abordar esse tópico, demorei alguns anos para ter coragem de trazê-lo para o contexto da saúde mental. Tive que fazer formação de yoga. E ter mais de 8 anos de prática de yoga e meditação para reconhecer como a conexão, para além de nós, nos leva a um lugar dos mais importantes: o de sincronizar, fluir e intuir. Uma instância que vai muito além do que acontece com a racionalidade e o apego às emoções. 

A instância espiritual é o exercício do esvaziamento do EU para que o TODO atue de forma inexplicavelmente extraordinária, é o lugar onde habita a graça e o entusiasmo de saber, mesmo quando não sabemos por que sabemos. 

Do autoconhecimento para ética como caminho

O autoconhecimento nos ajuda a nos desenvolvermos como sujeitos autônomos e responsáveis, duas condições fundamentais para nos tornarmos sujeitos éticos. Além disso, como sujeitos éticos, precisamos ter consciência e diferenciar o bem e o mal. Sendo este último definido como tudo aquilo que, de alguma forma, violenta e desrespeita outros humanos, animais e a vida. 

Quanto mais buscamos desenvolver nossas predisposições éticas, mais evoluímos como sujeitos éticos. Assim, somos cada vez mais capazes de refletir, deliberar e questionar sobre nosso caminho e nossas escolhas. Como elas se desdobram e impactam na nossa vida, na dos outros e no mundo.

Não há como fugirmos mais. Nenhuma regra, lei ou moral é suficiente para dar conta da complexidade da vida humana no mundo BANI. Mais do que nunca, não há como calcular e antever todos os fatos. Agora, é preciso que saibamos pelo que estamos dispostos a correr riscos e onde, conforme nossa ética, vale a pena investir nosso tempo e vida!

Para maior reflexão, seguem algumas perguntas provocadoras:

  • Onde você irá colocar o foco da sua vida? Mesmo não tendo garantias que tudo se desdobrará como você quer ou gostaria. 
  • Em que vale a pena colocar o seu recurso mais precioso: o seu tempo? No fim do dia você só tem 24 horas para viver o dia, mesmo que você acelere tudo, ainda assim, vivendo num corpo humano, você só tem 24 horas diárias. 
  • Onde sua curiosidade te leva? O que você está sempre procurando conhecer e aprender, quais os seus interesses pelos quais você não mede esforços para saber mais?
  • Seus sonhos e expectativas sobre sua vida são autenticamente seus? Ou são a realização dos sonhos de outras pessoas e sociedade?  

Como lindamente escreveu Guimarães Rosa:

“viver é arriscoso”. 

Guimarães Rosa

Se a vida é um risco, reconhecer pelo que ela vale a pena viver nos ajuda a entender para onde devemos olhar e buscar.

No próximo texto iremos falar sobre o mundo BANI, as organizações de inteligência artificial. 


*Júlia Ramalho tem paixão por ajudar pessoas e organizações a resolver problemas complexos e a crescer. Sócia fundadora da Estação do Saber, empresa que trabalha com consultoria e desenvolvimento de pessoas e negócios. Tem mais de 30 anos trabalhando como consultora e mais de 18 trabalhando como psicóloga e coach. Ajudou mais de 1.200 executivos a desenvolver pessoas e expandir seus negócios. É Psicóloga, Administradora, Mestre em Administração e Coach de Executivos desde 2005. Em 2013, fundou a Federação Internacional de Coaching – capítulo Minas.

Em 2010 e 2011 participou como convidada da CICI- Conferência de Cidades Inovadoras em Curitiba falando sobre o impacto das redes sociais para divulgar ideias. Em 2010 foi convidada pela ONU para ir a Barcelona falar sobre como as redes sociais poderiam ajudar na implantação dos objetivos do Milênio. 

De 2015 a 2017 lançou o projeto de Designers do Futuro para ajudar a sensibilizar pessoas e organizações sobre o impacto das novas tecnologias no mundo do trabalho e nas organizações, tendo feito palestras em todo o Brasil sobre o tema. Além disso, tem experiência de mais de 10 anos como professora universitária e dá treinamentos de Design Thinking para inovação.

De 2015 a 2021 como coach e consultora da Ford no Projeto Mundial CEM (customer experience movement) onde adquiriu mais experiência com CX- Customer experience e EX- Employe Experience, usando dados e coaching como ferramentas. Em 2022/2023 é facilitadora no curso de CX/DT da Faculdade Unimed.

Em 2022 iniciou uma nova empresa DdF, empresa Brasil_Bangladesh, com soluções de Inteligência Artificial, Machine Learning e Blockchain. Junto com seu Sócio Arian, tem implantado soluções inovadoras para crescimento das empresas usando essas novas tecnologias.

Em resumo

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