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Abraço de afogados: como a queda da credibilidade da mídia afeta o futuro do jornalista

Velhas corporações de comunicação preservam práticas suicidas. No futuro do jornalista, há uma grande oportunidade para a produção de informações de qualidade

futuro do jornalista depende da capacidade de criar estratégias desvinculadas das empresas tradicionais
Photo by Bank Phrom on Unsplash

Carlos Plácido Teixeira
Jornalista I Radar do Futuro

Sem quebrar os modelos de produção de notícias e análises de acontecimentos, os jornalistas continuarão a pagar caro pela crise da imagem do jornalismo e das empresas de comunicação. Todos estamos sendo afetados negativamente pela falta de compromissos das corporaçõescom a informação minimamente isenta. O exemplo mais recente envolve o conflito entre a Rússia e a Ucrânia. Entre um lado e outro, o ideal era ser contra a guerra. Na impossibilidade, deveríamos demonstrar os interesses em jogo.

“Nós, jornalistas, precisamos fazer uma dolorosa autocrítica”, diz professor de jornalismo online e pesquisador em comunicação comunitária, Carlos Castilho. Ele avalia que o profissional de imprensa terá o seu papel contaminado. “Acabamos participantes da construção de uma narrativa sobre a guerra na Ucrânia que está nos levando a uma crise mundial, cujo desfecho é uma gigantesca incógnita, onde apenas uma coisa é certa: o número de perdedores poderá ser muitíssimo maior do que o de ganhadores.” 

Não é necessário ir à Eurásia para compreender os riscos envolvidos na prática cotidiana do profissional, especialmente o brasileiro, exposto à fúria dos apoiadores de extrema direita do presidente Jair Bolsonaro. Monitoramente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) sobre os ataques sofridos por jornalistas e meios de comunicação do país revela que, entre janeiro e abril de 2022 identificou 151 casos de agressão física e verbal ou outras formas de cercear o trabalho jornalístico. Houve um aumento de 26,9% em relação ao mesmo período de 2021.

Em 2022, o tipo de agressão mais comum continua sendo o discurso estigmatizante – assim como foi em 2019, 2020 e 2021 –, presente em 66,9% dos alertas identificados até abril. Foi registrado um aumento de 12 casos dessa forma de violência verbal em comparação com o mesmo período do ano passado. A categoria de “agressões e ataques”, que envolve violência física, atentados e ameaças explícitas, também aumentou, apresentando um salto de 80%.

Violência: jornalistas como alvo

Segundo o relatório “Violência contra jornalistas e liberdade de imprensa no Brasil”, lançado no início do ano pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), o País registrou recordes de violência contra os trabalhadores em 2021. Foram 430 episódios, de agressões verbais e ataques virtuais até atos de violência contra a organização dos trabalhadores. A lista inclui ameaças, assassinato, impedimento ao exercício profissional.

Um dos itens em destaque envolve a descredibilização da imprensa, com 131 fatos relatados. Em 2020, professores da Escola de Comunicação e Artes da USP alertavam que o aumento dos ataques acumulados já nos dois anos anteriores, demonstrava a articulação de um discurso organizado com o objetivo de desligitimar a atuação jornalística.

“Cenas de agressão a jornalistas se tornam comuns hoje no Brasil e no mundo”, denunciam, em entrevista em que analisam um evento do início de novembro daquele ano, em Santa Catarina. Jornalistas da NSC TV, afiliada da Rede Globo, cobriam o descumprimento da lei que proibia aglomerações nas praias do Estado e foram agredidos e impedidos de prosseguir com a reportagem. Em registros recentes, no dia 16 de maio, em Ouro Fino, interior de Minas, um vereador agrediu um jornalista a pedradas. Em março, no Centro da capital paulista, repórteres da TV Globo foram agredidos durante reportagem sobre a Feira da Madrugada do Brás.

A maior vítima da crise da imprensa será sempre o jornalista e o jornalismo. As corporações de comunicação, mesmo com perda de credibilidade nos últimos anos, não parecem se importar com a agressividade dos públicos. Profissional experiente e dos raros com autonomia para criticar a postura dos veículos, inclusive da Folha de S. Paulo, onde trabalha, Jânio de Freitas, demonstra a angústia em ver a queda da qualidade da cobertura da imprensa. “Os jornais têm caído bastante. Não são necessários do ponto de vista informativo, da informação cotidiana, da vida do leitor”, afirmou em entrevista para o site Poder360.


Jornalismo: aposta na mesmisse

Dois acontecimentos, com duas décadas de distância, demonstram como a mídia continua atuando a favor de apostadores. Não há espaço para autocrítica.

A bolha da internet em 2000

“Jornalistas acreditam mesmo em todas essas coisas que vocês publicam? Com uma mistura de ironia e maldade, um empresário da área de tecnologia solta a pergunta durante uma conversa informal entre nós, fonte e repórter, sobre as perspectivas e negócios do mercado de informática. O momento era de plena efervescência da grande bolha da internet, na transição entre séculos. 

Os procedimentos e a forma como a imprensa lidava com quase todas as novidades sobre mercado de  tecnologia da informação era a mesma de qualquer torcedor fanático. Ou engajado na busca de favores. Na época, fui testemunha de um fato constrangedor, ao participar de um almoço de lançamento de produtos com executivos da Microsoft. 

O editor de tecnologia de um jornal mineiro, integrante da família do conglomerado, cobrou, diante de todos os presentes, reprocidade da multinacional para a divulgação das novidades. “Afinal”, disse, “damos muito espaço para as notícias e não recebemos anúncios”.

Deslumbramento e falta de senso crítico predominaram — e ainda predominam, na verdade — no noticiário sobre o poder da computação e sobre o impacto da internet na vida das pessoas e das empresas. Quem vive hoje sob a força dos smartphones não tem ideia das limitações dos usuários de computadores no início do século. Talvez não consiga entender a luta do acesso discado — e caro  para a maioria. 

É quase surreal pensar que as pessoas aguardavam a meia-noite para poder ficar mais tempo na rede. Que havia limites no tamanho de mensagens e de carregamento das imagens. E nem imagina os riscos e dificuldades para baixar músicas ou a paciência necessária para baixar uma foto.

Em síntese, a imprensa teve um papel central na formação da “bolha das pontocom”, entre os anos 1994 e 2000. Um período marcado pela forte elevação dos preços das ações de empresas de tecnologia de comunicação e informação. Jornais e revistas, rádios e TVs, eram as responsáveis pela criação dos mitos das “empresas bilionárias, nascidas em garagens”, graças aos gênios nerds e empreendedores. E pela repetição do slogan da época: “quem não estiver na internet, estará morto”.

Multinacionais de TI e investidores anunciavam investimentos milionários em ideias inovadoras. Adolescentes de 16 anos se apresentavam nas exposições de informática como gerentes de marketing. Com seus terninhos, se sentiam empoderados. Diziam ser abordados por grandes investidores a todo momento. Um futuro novo milionário ganhava páginas de matérias nos veículos especializados em economia e negócios a nova economia difunde a crença na riqueza rápida.

O dia 10 de março de 2000 marca o “estouro da bolha”. E o momento em que o jornalismo econômico, alheio às suas responsabilidades como formador de opinião, inicia a etapa de especulações sobre as razões da crise que levou a fortes quedas das bolsas de valores, pedidos de falência e fechamento de empresas. 

Bolha 2: futuro é bitcoin

Focada em seus negócios de venda de notícias no formato de propaganda, a imprensa tradicional repete as estratégias de cobertura de grandes acontecimentos. Agora mesmo, há uma nova oportunidade no mercado tecnológico. As criptomoedas são a mina de ouro dos investidores. Falta transparência sobre o que é o mercado e seus impactos. Nas redes sociais, vendedores, no papel de influenciadores, mostram ganhos milionários com a compra das moedas digitais. 

Ao mesmo tempo a maior parte da cobertura jornalística se entrega de corpo e alma ao processo de “evangelização”, o convencimento dos consumidores sobre  as promessas de Fortuna para quem compra os ativos digitais. Faça uma pesquisa agora no Google Notícias com a palavra-chave bitcoin e será possível ver como o jornalismo naturaliza a cobertura dos negócios. Há excesso de confiança, por parte da mídia, nas intenções de criadores, investidores e “evangelizadores” do novo sistema. 


Mudanças de atitudes

As grandes mudanças da cobertura jornalística não virão das empresas tradicionais de mídia. Nem é possível imaginar a possibilidade de uma autocrítica. No papel de aparelho ideológico de estado, as empresas de comunicação não tendem a abrir mão de seus métodos de construção de histórias. Mesmo o jornalista que se imagina como parte do sistema, responsável pela reprodução do discurso dominante e protegido pelos patrões, poderá ser engolido pela futura queda de credilidade do jornalismo tradicional.

Não há autocrítica da imprensa porque os seus executivos seguem acreditando em seus métodos de negociação comercial e a influência econômica e política. O jornalismo está inserido na Revolução Industrial. E sonha com passos para o passado, como na ausência de críticas ao processos de desindustrialização e expansão da dependência da produção do agronegócios. O leitor ainda vai entender, em mais algum tempo, que existe uma crise do capitalismo global, que os Estados Unidos vão produzir conflitos para impedir a expansão da China e que o desemprego será tão crescente quanto a concentração de renda.

Os jornais se beneficiam da superficialidade. Afinal, mesmo com perda de credibilidade, no Brasil, 54% das pessoas ainda confiam na imprensa, de acordo com o Instituto Reuters de Estudos de Jornalismo da Universidade de Oxford. O aumento da confiança registrado em 2021 teve a influência positiva da cobertura da pandemia.

O cenário de aumento das vulnerabilidades e descrédito da velha mídia impacta o futuro do jornalismo e dos jornalistas. Entre as ameaças, o embarque na onda de descrédito da profissão, influenciada cada vez mais por influenciadores, descompromissados com a missão de informar. Mas há um lado positivo. As dificuldades da mídia tradicional vão abrir oportunidades. No horizonte, há uma grande oportunidade para a produção de um jornalismo verdadeiro. Só é necessário superar os desafios adiante de nós.

Em resumo

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