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Quando a ansiedade climática domina nossas mentes

Fenômenos extremos, como altas temperaturas, tempestades e inundações, fazem crescer os registros da ansiedade climática entre a população

CARLOS PLÁCIDO TEIXEIRA
Jornalista Responsável | Radar do Futuro

Meus primeiros sintomas de pânico surgiram em 2023. O ano registrou um grande número diferentes catástrofes e recordes climáticos. Foi um momento histórico da trágica progressão das mudanças climáticas em nível global. Em junho, a temperatura da superfície do Atlântico Norte atingiu o aumento máximo de 1,3 grau Celsius em relação aos valores registrados anteriormente às Revoluções Industriais. Nível superado já em 2014, com 1,4 grau, confirmando a reversibilidade do processo de descontrole ambiental.

Como já faziam há anos, diante dos novos dados e eventos registrados, cientistas alertaram o mundo para o perigo da mudança profunda nas correntes que regulam a temperatura e a vida dentro e fora dos oceanos. As ondas de calor registradas nas costas de grande parte do mundo, Estados Unidos, México, Equador, Europa, Japão, Mauritânia e África, foram a prova do desequilíbrio.

Nesse período comecei a ter os primeiros sintomas de síndrome de pânico, a convivência com ataques de ansiedade. Com frequência cada vez maior, apresentei episódios repentinos de medo ou desconforto intenso, acompanhados por sintomas físicos, como palpitações, falta de ar, tonturas e sensação de morte iminente. Um processo que foi crescendo lentamente, até passar a ser um tormento de todos os dias.

Antecedentes: chuvas de verão

Diariamente, ao acordar, olhava para o horizonte, pela janela do meu quarto, com o objetivo de “prever a possibilidade de novos temporais”. Antes de adoecer, considerava um privilégio poder ver, à distância, as montanhas que cercam a minha cidade. Pela manhã, o céu azul em contraste com o verde e o concreto. Eventualmente, nas tardes de verão, acompanhava, do 12º andar do meu prédio, a chegada de nuvens cinzas das chuvas, antecipando a chegada de pancadas fortes e temporais eventuais.

Em cerca de 20 anos, testemunhei o aumento progressivo da intensidade das mudanças de humor do clima. Inicialmente, corríamos para fechar todas as janelas do apartamento para evitar a entrada de água. Passamos à fase da antecipação: ao sair de casa, nunca deixar janelas abertas. Em seguida, fomos obrigados a vedar cada fresta, por conta das ventanias.

Até que, um dia, nada foi mais suficiente para garantir a sensação de proteção. O temporal foi tão forte que lançou pedaços de madeira contra as vidraças, quebrando uma delas. O andar alto não foi suficiente para proteger. Por sorte, não havia ninguém no quarto.

Depois do acidente, pareceu normal ficar mais precavido. Mas um dia comecei a identificar comportamentos obsessivos. Para me adiantar aos imprevistos, viagiava o horizonte a todo instante. Qualquer nuvem mais escura era capaz de provocar palpitações ou batimentos cardíacos acelerados, suor, tremores, falta de ar ou sensação de asfixia.

Cada vez mais eu recorria aos aplicativos de serviços de meteorologia. Confiando e desconfiando de todos. Convivendo com a ansiedade de pesquisar a todo momento sobre acontecimentos do momento e futuros, envolvendo o clima da minha cidade e do mundo.

A ansiedade climática

A história acima, baseada em fatos reais, sintetiza a tendência de proliferação dos casos de mudanças de comportamento geradas por traumas, que já afetam jovens e adultos. Calor ou frio em excesso, inundações, secas, incêndios e desastres naturais entre outros eventos climáticos severos têm, cada vez mais, estressado as pessoas ao redor do mundo, levando a processos que ganham o rótulo de ansiedade climática ou ecoansiedade.

A preocupação com as mudanças climáticas afeta 79% dos brasileiros, segundo os dados de uma pesquisa de percepção dos brasileiros sobre o tema das mudanças climáticas, realizada, em 2022, pelo Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS), em parceria com o Programa de Comunicação das Mudanças Climáticas da Universidade de Yale (EUA).

Segundo o documento, 52% dos entrevistados se disseram “muito preocupados” e 27% “de alguma forma preocupado”. Do total da população, 20% disse que não está “muito preocupado” ou “nem um pouco preocupado”. A pesquisa também mostrou que 94% dos brasileiros – 196 milhões de pessoas – responderam que acreditam que aquecimento global e mudanças climáticas esteja acontecendo.

O trabalho também mostrou que 74% dos brasileiros disseram haver concordância na Ciência sobre a existência das mudanças climáticas. Nos Estados Unidos essa porcentagem é de 58%.

No Brasil, a porcentagem de pessoas que acreditam que as mudanças climáticas vão prejudicar as futuras gerações é alta: 87% da população. Nos Estados Unidos, o número é de 53%.

O Brasil ainda apresenta uma boa posição quando comparado com outros grandes emissores de gases estufa. Nos Estados Unidos, por exemplo, apenas 27% disseram estar “muito preocupados” e 37% “de alguma forma preocupado”. Cerca de um quarto da população americana não se preocupa de nenhuma forma com o tema.

Novamente, quando comparado com os Estados Unidos, o cenário do Brasil é positivo: 70% dos americanos dizem acreditar. “Esse é um padrão que vem se repetindo de novo e de novo”, diz Anthony Leiserowitz, diretor do Programa em Mudanças Climáticas da Universidade de Yale.

Projeções até 2030

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, até 2030, a depressão será a doença mais incapacitante do mundo, afetando mais pessoas do que qualquer outra doença, incluindo câncer e doenças cardíacas. A OMS também estima que, até 2030, haverá mais pessoas com transtornos mentais do que com diabetes.

Há uma série de fatores que contribuem para o aumento das doenças mentais, incluindo:

  • O aumento do estresse na vida moderna
  • O aumento das condições ambientais
  • O aumento da desigualdade social
  • O aumento da violência
  • O aumento da exposição a toxinas ambientais
  • O aumento da obesidade e do sedentarismo
  • O aumento do uso de drogas e álcool
  • As doenças mentais podem ter um impacto devastador na vida das pessoas, levando a problemas no trabalho, na escola, nas relações pessoais e na saúde física. As doenças mentais também podem aumentar o risco de suicídio.

Em resumo

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