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As guerras escondem os seus verdadeiros interesses e patrocinadores

São as grandes corporações que financiam os exércitos, as armas, os governos e as guerras, enquanto as populações enfrentam cenários de horror

Carlos Plácido Teixeira
Jornalista I Radar do Futuro

O conflito que envolve, neste início de 2022, a Rússia e Ucrânia, com participação direta ou indireta dos países do Ocidente, sob as ordens dos Estados Unidos, confirma a sina da humanidade, destinada a conviver com mais um ano em que não teremos uma chance para a paz. Nem nos anos seguintes. O conflito virou mais um evento a dividir torcidas, entre os que estão a favor ou contra um dos lados. A humanidade se conforma com as guerras e com diferentes manifestações de ódio.

E mais de 7 bilhões de seres humanos estão fadados a pagar a conta da existência de potências militares e de grupos dominantes, defensores de projetos expansionistas e de eliminação de outros, com o objetivo tácito ou explícito de beneficiar uns poucos. Enquanto isso, a verdade já é uma das vítimas da guerra, como sempre.

“Na luta do bem contra o mal, é sempre o povo que morre”, alertava o jornalista e pensador uruguaio Eduardo Galeano, autor do livro “As Veias Abertas da América Latina”, obra que ajudou várias gerações a compreender os crimes cometidos pelos colonizadores da região.

Os conflitos entre países existem por conta de interesses econômicos, políticos ou religiosos difusos. É mentira deslavada o discurso de que defendem a democracia e a liberdade de povos. A guerra é simplesmente um negócio, marcado pela ausência de transparência sobre o envolvimento dos grupos de poder político e econômico, de militares, de fabricantes de armas, do sistema financeiro e da indústria do petróleo.

“As guerras dizem que ocorrem por nobres razões: a segurança internacional, a dignidade nacional, a democracia, a liberdade, a ordem, o mandato da civilização ou a vontade de Deus. Nenhuma tem a honestidade de confessar: Eu mato para roubar”.

Eduardo Galeano, escritor

O capitalismo em crise reage com guerras

No cenário dos próximos anos, ainda com a lenta recuperação dos efeitos da pandemia no sistema produtivo global, os Estados Unidos, à frente de organismos com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), tendem a intensificar o papel de fomentadores de guerras. Dependente visceral das indústrias de armas e das ambições das corporações petrolíferas, das instituições financeiras e das big techs — as mega corporações tecnológicas –, o país compensa suas próprias dificuldades internas com o envolvimento em conflitos novos e preservação de antigos. 

Com mais de 600 bases militares espalhadas pelo mundo, único entre os quase 200 países do mundo, aos Estados Unidos interessa exclusivamente manter as suas estratégias de poder e evitar a concorrência de outros países ou blocos de poder. Para isso, o jogo é de vale tudo. Envolve manipulação de informações e de comunicação, ações cibernéticas, bombardeios e bloqueios econômicos contra países. Obrigado a sair de rabo entre as pernas do Afeganistão, como um derrotado, os EUA sufocam o país com sanções. Como consequência da destruição deixada para trás, 90% da população vivem próxima da fome absoluta.

O capitalismo global ainda sofre os impactos negativos da quebra do sistema financeiro de 2008. A “bolha imobiliária” foi considerada uma das maiores crises da economia global desde a “grande depressão” da década de 1930. O governo de Donald Trump e a invasão do Congresso norte-americano, na transição para Joe Biden, além da eleição de governos de direita e extrema-direita pelo mundo, reforçam a percepção sobre o colapso do centro político e econômico do Ocidente, comandado pelos EUA.

A pandemia impôs o aprofundamento dos problemas de todo o sistema, inclusive ampliando a concentração de renda e o desemprego. O governo atual do Partido Democrata convive com uma elevada reprovação. Mesmo com a taxa de desemprego de 4%, os norte-americanos estão pessimistas com a economia, em grande parte devido à disparada dos preços ao consumidor.

Guerras como solução

Em momentos assim, velhos líderes políticos e econômicos sugerem velhas receitas: destruição. Por isso mesmo, em seu discurso à nação o presidente Biden, pressionado pela queda na aprovação do eleitorado, enfatiza que é “importante combater os avanços do presidente da Rússia, Vladimir Putin”. No cenário de disputas, não só agora, mas nos próximos anos, China e Rússia continuarão sendo alvos preferenciais dos Estados Unidos e de seus aliados, que incluem, em especial, os europeus. Os países mais fortes da comunidade dos BRICs são acusados de pretensões imperiais. A força do Brasil na década de 2010, com o governo Lula, foi esvaziada desde o início dos governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro.

A maior preocupação dos “ocidentais do norte” é o projeto chinês das Rotas da Seda, lançado pelo governo de Xi Jinping, com o objetivo de promover a integração comercial entre a Europa, Ásia, África e Oriente Médio. A iniciativa, com foco comercial, é apontada como “prova das motivações imperiais dos chineses”. Como reação, países europeus promovem a “Iniciativa Global Gateway”, que tem o objetivo de investir 300 bilhões de euros em projetos de infraestrutura. Os recursos serão destinados para a África, Ásia e América Latina.

A militarização da concorrência com a China ainda virá adiante. Mas são os métodos tradicionais de paises miltarizados que vão disputar espaços. No cenário provável de curtíssimo prazo, o governo Joe Biden expande, com todos os meios disponíveis, o conceito de guerra híbrida, em que as tropas estrangeiras são substituídas por sanções, ações cibernéticas, manipulação de fontes de informações e desestabilização de governos. Até mesmo a exploração de grandes fluxos de migrantes, desesperados por conta de conflitos ou por fome, assume a forma de arma estratégica. 

Especialistas em geopolítica acreditam que entramos em uma era de conflito perpétuo, em que a maioria dos combatentes e quase todas as vítimas serão civis. Os analistas independentes, distantes da binariedade dos que estão contra ou a favor de um país ou outro, lamentam a expectativa é de que, nessa era da falta de paz, os miseráveis ​​da Terra sejam transformados em munições involuntárias.

Nem A, nem B ou C, mas contra a guerra

A destruição deixada pelos exércitos é a vitrine da indústria de armas (Foto: Wikimedia Commons)

No início de fevereiro, o exército dos Estados Unidos anunciou que concluiu, com sucesso, o primeiro teste de voo de um helicóptero autônomo, ou seja, sem intervenção de um piloto. O experimento foi feito sem nenhum ocupante na cabine. Segundo a Agência de Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa (DARPA, na sigla em inglês), o teste foi um avanço importante no Programa Aircrew Labor In-Cockpit Automation System, também chamado de ALIAS.

Com o novo conflito no cenário da Eurásia, a indústria bélica pode comemorar oportunidades para o desenvolvimento e vendas de novos “brinquedos de adultos”. Vale pensar que, simbolicamente, as máquinas de custo milionário só têm valor real quando usadas em cenários de combate. E a imprensa comercial, aliada dos grandes negócios, continuará dando publicidade para as realizações dos fabricantes de armas, admirada com as inovações que matam mais, com riscos reduzidos para os matadores.

Ao apontar as culpas dos Estados Unidos, nenhuma pessoa se torna automaticamente inimiga de norte-americanos, nem aliada da Ucrânia ou da Rússia. Nem de qualquer outro país detentor de exércitos fortes e de armas atômicas. Os riscos para o futuro do planeta não estão associados a uma guerra particular ou a outra. A corda bamba dos próximos anos depende de mudanças de sistema. E da compreensão que a atual divisão de poder, baseada em alta da concentração de renda e aumento da miséria, vai levar a resultados trágicos.

Todas as guerras precisam ser rejeitadas pelos cidadãos que pagam os impostos que financiam os “brinquedos de matar” dos militares. O futuro depende da denúcia e conscientização sobre os grupos envolvidos em disputas econômicas, políticas ou religiosas e que estimulam as guerras.


Em mídias sociais, a pesquisa sobre as palavras-chave “contra as guerras” mostra declarações de rejeição a todos os conflitos.

“Aos que, como eu, têm ódio às guerras, indignem-se contra elas, sobretudo quando trata-se de matança para espoliar, ou mudar o curso da história objetivando em todas as continuidade do estabelecimento dominante. Chorem, hipócritas, também sobre os mortos da Somália”
Internauta do Twitter.

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