Carlos Plácido Teixeira
Jornalista I Radar do Futuro
Proprietária de uma empresa de equipamentos para divulgação de eventos, a empresária Rosana Moreira manteve, durante quatro anos, seus dois filhos matriculados em uma escola infantil próxima de casa sem retirar um tostão de caixa. O pagamento recíproco foi garantido por trocas. A educação das crianças foi quitada com a divulgação da escolinha por meio de painéis luminosos instalados em regiões estratégicas do bairro.
O nome de Rosana é fictício, mas o personagem é verdadeiro. Com alguma frequência, amigos e parentes são surpreendidos por novidades envolvendo ela e a família. Seja para viagens ao litoral de Santa Catarina ou Pernambuco ou pelos jantares em restaurantes caros, distribuídos como presentes de final de ano. Sem tirar dinheiro da empresa, ela conseguiu garantir a manutenção da casa e a realização de projetos pessoais durante os últimos anos.
A palavra que resume o consumo de produtos e serviços pela empresária tem nome próprio: permuta. Por definição, o processo de troca de mercadorias entre pessoas sem o envolvimento de dinheiro vivo. A modalidade de negociação remete à antiguidade, quando as pessoas trocavam mercadorias nas feiras. Recentemente, virou alternativa que ganha força no cenário de mudanças dos mercados globais. Mais sofisticado, naturalmente, agora tem a forma de plataformas digitais, onde empresários e profissionais liberais se inscrevem e, se aprovados, podem realizar suas transações.
Há 12 anos, o empresário Leonardo Bortoletto teve papel pioneiro ao criar o Clube da Permuta como uma franquia, presente atualmente em 23 cidades brasileiras. Para ele o momento de crise da economia, com a retração provocada pelo isolamento imposto pela pandemia, cria um ambiente favorável para o sistema de trocas. Afinal, surpreendidas pela queda das vendas, muitas empresas se viram com estoque parado ou profissionais com tempo disponível.
“Já tivemos trocas das mais variadas, de alimentos a avião, além de imóveis, terrenos e veículos, entre outros, assegura Bortoletto. Segundo ele, há empresas em que 30% despesas operacionais são pagas por permutas. Os clientes podem ser de uma pequena confeitaria de bairro a um hipermercado. Ao contrário do modelo tradicional, unilateral, em que uma pessoa troca produto com outra, o sistema enfatiza a possibilidade de trocas multilaterais. Na prática, as permutas são o efeito secundário dos relacionamentos entre os integrantes do grupo.
Tendências
Plataformas de permuta não chegam a ser exatamente novidade. Nem a proposta de multiplataformas, que atendem interesse de empresários. O que há de novo é uma tendência de consumidores reavaliarem suas prioridades. “Em meio à incerteza econômica, os consumidores revisitam um método antigo para obter bens. Voltando aos velhos costumes para obter bens ou serviços em um mercado altamente competitivo, a troca está vendo um aumento em todo o espectro de consumidores que procuram um negócio para aqueles que buscam oferecer serviços essenciais para a vida”, avalia o site de tendências Trendhunter.
Usando mídias sociais e aplicativos de smartphone para se conectar, o conceito atualizado de troca está apresentando o ato às gerações mais jovens e ampliando a economia tradicionalmente fechada para ser mais focada na comunidade e no consumidor. O ambiente pandêmico testemunhou o aumento do interesse pela alternativa de negociação. Inclusive de quem, preocupado no início dos primeiros casos, estocou comida e papel higiênico e percebeu que o pânico não foi justificado. A solução foi negociar os produtos externamente.
Uma matéria publicada pelo site da BBC, em agosto, relatava que “em todo o mundo, as pessoas têm se voltado para a troca, comercialização e permuta durante a pandemia do coronavírus, seja para fazer sua parte pela comunidade local, economizar dinheiro ou simplesmente adquirir ingredientes de panificação difíceis de encontrar”. Foi o resultado da incerteza econômica iminente e do aumento dos níveis de ansiedade. “A permuta se tornou solução alternativa emergente para sobreviver – e se manter ocupado – em meio à Covid-19”, assinala a publicação.
Em resumo