Elisângela Orlando
Jornalista
Abri a porta. Mais um dia colorido. Olhei para trás e vi meu pai, agora com 82 anos, brincando com minha filha, Catarina, 8. Uma sensação de alívio percorreu meu corpo. Era 2025, mas ainda não tinha conseguido superar totalmente o medo de sair de casa. Conferi minha bolsa para ver se estava tudo ali: álcool, sabonete, hidratante, protetor solar e meu estojo de maquiagem. Olhei para meu batom. Vermelho, vibrante, vivo. Eu estava viva.
Ainda trabalhava a maior parte do tempo em casa. Depois da pandemia, outras crises vieram, inclusive a climática, tornando o ambiente fora de casa insuportável durante o dia. A adaptação foi difícil. Com o tempo, consegui planejar os dias e cumprir minhas metas. Até atividade física comecei a fazer, algo que achava impossível antes. Minha alimentação também não era mais a mesma. Ainda bem. O que eu mais queria é estar saudável – eu e o resto do mundo.
Lembro-me de que tudo mudou muito rápido. Há dez anos, ninguém imaginava que passaria tanto tempo isolado, sem convívio social e com um pedaço de tecido cobrindo o rosto.
Mesmo quando a vacina chegou, a máscara continuou a fazer parte do visual. Até hoje, levo duas na bolsa: cientistas defendem que o desequilíbrio ambiental provocado pelo homem pode levar ao surgimento de novas doenças e desencadear outras pandemias.
Acredito que o mundo nunca mais será o mesmo após a Covid-19. Até mesmo o mercado da beleza, considerado um dos mais resistentes à recessão, sentiu o baque. Dessa vez, o “efeito batom”, caracterizado pela elevação do consumo de cosméticos pelo público feminino em crises econômicas, não foi observado.
Com as pessoas em casa, as fabricantes de maquiagem tiveram de inovar e buscar soluções rápidas para sobreviver. As reuniões online se tornaram o único momento em que uma make-up perfeita fazia diferença. Como saúde e bem-estar se tornaram prioridade não só para mim, a maquiagem ganhou novas companhias dentro de qualquer bolsa: álcool em gel, sabonetes e lenços de papel.
Graças a esses produtos, a indústria brasileira da beleza permaneceu firme no primeiro ano da pandemia. Somos o quarto maior mercado consumidor do mundo. O setor até registrou alta nos primeiros cinco meses de 2020, com crescimento de 0,6% no faturamento e de 2,8% no volume do setor, comparado ao mesmo período de 2019. É o que diz a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC)
Ficar com o rosto coberto por muito tempo, além de incômodo, pode provocar problemas na pele. Claro que as empresas também sabiam disso e investiram em inovação. A Global New Products Database (GNPD) da Mintel registrou mais de 180 mil novos produtos cosméticos ou variantes em 2020.
O novo look deu origem a diversas expressões novas durante a pandemia, como maskne, bronzeado de janela, covid-washing e cara de quarentena. Em 2025, eu ainda ouvia muitas delas quando ia ao salão de beleza da Caroline Iglesias, amiga da época de faculdade.
Em 2016, ela fechou a agência de publicidade que manteve por 16 anos para se dedicar ao que mais gostava de fazer: make-up. Investiu em qualificação e abriu um salão de beleza de alto nível no Santa Tereza, um bairro tradicionalmente conhecido por reunir alguns dos melhores bares de Belo Horizonte.
A pandemia poderia ter acabado com o sonho da Caroline, mas não foi o que aconteceu. Sem poder receber a clientela no salão, ela passou a oferecer cursos online. A visibilidade digital foi importante para a retomada do trabalho presencial, uma vez que a tornou mais conhecida, criando novos leads.
Ciente de que as coisas não mudariam tão rápido, Caroline adaptou o salão às normas sanitárias da Organização Mundial de Saúde (OMS) apostou no atendimento cada vez mais personalizado, conquistando consumidores com ticket médio mais alto. Sim, ela conseguiu elevar o faturamento pouco tempo depois, se foi essa a pergunta que você fez.
Um filme passou pela minha cabeça enquanto eu terminava de passar meu batom que, além de ser vermelho, tinha hidratante, protetor solar e uma camada protetora que reduzia o risco de contato de partículas externas diretamente com a boca, uma novidade no mercado. Estava pronta. Minha make-up colorida combinava com a alegria que eu sentia em poder sair de casa naquela tarde.
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