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Ganhos de quem tem carteira assinada é maior do que a de trabalhadores de plataformas digitais, constata nova pesquisa do IBGE
Radar do Futuro *
“A função das plataformas é reduzir a remuneração dos trabalhadores. É uma coisa a olhos vistos.” A afirmação é do professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e procurador do Ministério Público do Trabalho, Rodrigo Carelli, em entrevista à Agência Brasil, ao avaliar os dados do módulo Teletrabalho e Trabalho por Meio de Plataformas Digitais, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), divulgada no dia 25 de outubro, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O órgão pondera que “as estatísticas são experimentais, ou seja, estão em fase de teste e sob avaliação”. Mas o levantamento sobre a plataformização do mercado de trabalho é suficiente para jogar luz sobre a realidade de precarização das relações de produção ao gerar uma “fotografia estatística” do cenário. Na verdade, pondera o especialista, há uma atraso, diante da ausência de iniciativas semelhantes.
Afinal, o fenômeno da uberização já tem algum tempo. E as empresas de plataformas de motoristas e de alimentos, por exemplo, já ganharam uma representatividade relevante no mercado de trabalho.
A pesquisa
No quarto trimestre de 2022, segundo os dados do IBGE, dos 87,2 milhões de brasileiros integrantes da população ocupada de 14 anos ou mais no setor privado, 2,1 milhões realizavam trabalhos por meio de plataformas digitais. Deste total, 1,5 milhão de pessoas – ou 1,7% da população ocupada no setor privado – trabalhavam por meio de aplicativos de serviços e 628 mil as plataformas de comércio eletrônico.
A comparação de trabalhadores na mesma função dentro e fora das plataformas mostra a diferença de remuneração. Os trabalhadores que trabalham fora das plataformas, tanto entregadores como motoristas, recebem mais fora das plataformas. “Esse, para mim, é o dado mais importante no tópico da remuneração”, afirma Rodrigo Carelli, ressaltando a necessidade de fazer comparações em uma mesma profissão para avaliar o rendimento de cada um.
As avaliações devem levar em conta, portanto, “entregadores nas plataformas e entregadores fora da plataforma”. Não há como comparar um médico na plataforma com um entregador. Não há como comparar com o resto da população brasileira, porque as plataformas são somente um meio de gestão de trabalho.
A parte mais importante que tem no achado em relação à remuneração é exatamente essa. Trabalhadores em uma mesma categoria. Se ele atuar fora da plataforma, a tendência é de que ganhe mais que na plataforma e ainda em o achado que eles trabalham muito mais horas nas plataformas do que fora das plataformas”, observou.
“A gente não pode colocar tudo no mesmo balaio. Eu acho que eles [IBGE] tratam bem isso, quando eles dividem por profissão.”
Plataformização
“Consideramos fundamental a disponibilização de uma base de dados que possibilite melhor quantificar e compreender o fenômeno da plataformização do trabalho no país. Esse foi o objetivo da introdução do módulo na pesquisa”, afirmou Gustavo Geaquinto, analista do levantamento,
O grupamento das atividades transporte, armazenagem e correio foi o que reuniu mais trabalhadores (67,3%). O grupo abrange tanto o serviço de transporte de passageiros quanto os serviços de entrega, que são os aplicativos mais frequentes. Em seguida, aparece o setor de alojamento e alimentação, com 16,7%. “Aqui é sobretudo por causa dos estabelecimentos de alimentação, que usam as plataformas de entregas para clientes”, disse.
A categoria de emprego mais usada foi a “feita por conta própria” (77,1%). “Empregados com carteira assinada eram apenas 5,9% dos plataformizados, enquanto no setor privado, os empregados com carteira eram 42,2 %. Havia uma forte prevalência dos trabalhadores por conta própria no trabalho plataformizado.”.
O trabalho principal por meio de aplicativos de transporte de passageiros, em ao menos um dos dois tipos analisados de táxi ou excluindo táxi, alcançou 52,2%, ou 778 mil, do total de trabalhadores de plataformas. Nos aplicativos de entrega de comida ou produtos trabalhavam 39,5%, ou 589 mil. Já os trabalhadores de aplicativos de prestação de serviços gerais ou profissionais representavam 13,2% ou 197 mil.
Plataformas
O aplicativo de transporte particular de passageiros foi a plataforma digital mais utilizada pelos usuários (47,2%), seguido do serviço de entrega de comida, produtos, etc (39,5%), do aplicativo de táxi (13,9%) e do aplicativo de prestação de serviços gerais ou profissionais (13,2%).
“Tem sido observado ao longo do tempo o aumento dessa forma de trabalho e esse fenômeno tem levado a importantes transformações nos processos e nas relações de trabalho, com impactos tanto no mercado de trabalho do país, como sobre negócios e preços de setores tradicionais da economia”, afirmou o analista. Ele alertou que pode haver qualquer tipo de sobreposição de uso de aplicativos de táxi pelos trabalhadores e, por isso, a soma ultrapassa 100%.
Regiões
A região com maior percentual foi o Sudeste (2,2%), com 57,9%, ou 862 mil pessoas, do total de trabalhadores plataformizados, conforme denomina o IBGE essa parcela do mercado de trabalho. Segundo o levantamento, nas outras regiões, o percentual de pessoas ocupadas que realizavam trabalho por meio de aplicativos de serviços ficou entre 1,3% e 1,4%.
A maior proporção de pessoas que trabalhavam com aplicativos de transporte particular de passageiros, excluindo os de táxi, estava na região Norte: 61,2%, ou 14 pontos percentuais (p.p.) acima da média nacional.
Características
Os homens (81,3%) eram a maioria dos trabalhadores plataformizados. Segundo o levantamento, o percentual é uma proporção muito maior que a média geral dos trabalhadores ocupados (59,1%). As mulheres eram 18,7% do total desses trabalhadores.
Idade
Na distribuição por idade, quase a metade (48,4%) das pessoas que trabalhavam por meio de plataformas digitais de trabalho estavam no grupo de 25 a 39.
Escolaridade
Em termos de nível de instrução, os plataformizados concentravam-se nos níveis intermediários de escolaridade, com preponderância no nível médio completo ou superior incompleto (61,3%), que correspondia a 43,1% do total da população ocupada que não utilizava plataformas.
Rendimentos
Os trabalhadores plataformizados tinham, no 4º trimestre de 2022, rendimento 5,4% maior (R$ 2.645) que o rendimento médio do total de ocupados (R$ 2.513). Na mesma comparação, eram os que trabalhavam mais horas semanais: 46h contra 39,6h.
“Para os dois grupos menos escolarizados, o rendimento médio mensal real das pessoas que trabalhavam por meio de aplicativos de serviço ultrapassava em mais de 30% o rendimento das que não faziam uso dessas ferramentas digitais. Por outro lado, entre as pessoas com o nível superior completo, o rendimento dos plataformizados (R$ 4.319) era 19,2% inferior ao daqueles que não trabalhavam por meio de aplicativos de serviços (R$ 5.348)”, apontou o levantamento.
Cor e raça
Gustavo Geaquinto informou que na distribuição por cor e raça, não foram observadas diferenças significativas entre os plataformizados e os que não utilizavam plataformas. Os brancos representavam 44% dos plataformizados contra 43,9%, os pretos eram 12,2% contra 11,5% e os pardos 42,4 contra 43,4%.
Previdência e informalidade
No 4º trimestre de 2022, apenas 35,7% dos plataformizados eram contribuintes da previdência, enquanto entre os ocupados no setor privado eram 60,8%. Na informalidade a proporção de trabalhadores plataformizados (70,1%) era superior à do total de ocupados no setor privado (44,2%). “Aqui esse dado de informalidade se refere exclusivamente ao trabalho principal da pessoa”, concluiu.
Metodologia
A coleta dos dados do módulo inédito Teletrabalho e Trabalho por Meio de Plataformas Digitais da PNAD Contínua se refere ao 4º trimestre de 2022 entre a população ocupada de 14 anos ou mais de idade, exclusivamente o setor público e militares. O levantamento foi feito com base no trabalho único ou principal que a pessoa tinha na semana de referência.
O IBGE destacou que conforme a Organização Internacional do Trabalho (OIT) definiu em 2021, “as plataformas digitais de trabalho (ou de serviços),viabilizam o trabalho por meio de tecnologias digitais que possibilitam a intermediação entre fornecedores individuais (trabalhadores plataformizados e outras empresas) e clientes”.
- Com informações da Agência Brasil/EBC Economia
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CARLOS PLÁCIDO TEIXEIRA
Jornalista Responsável | Radar do Futuro
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