Novo relatório da ONU confirma o aumento da gravidade do cenário global do clima
Carlos Plácido Teixeira
Jornalista I Radar do Futuro
Os primeiros 20 anos do século 21 foram marcados por um aumento “impressionante” dos desastres climáticos. O aumento dos problemas decorrentes das mudanças climáticas é uma das conclusões de um novo relatório do Escritório da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Redução de Risco de Desastres. No Brasil, os dados são confirmados por especialistas como a professora Rachel Albrecht, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). Segundo ela, todos os extremos, seja de temperatura mínima ou máxima, chuvas e secas todos os extremos estão acontecendo.
De acordo com a pesquisa da ONU, as nações ricas pouco fizeram para reduzir as emissões associadas a ameaças climáticas responsáveis pela maior parte desses eventos. Foram registrados 7.348 desastres em todo o mundo nas últimas duas décadas. Aproximadamente 1,23 milhão de pessoas morreram, cerca de 60 mil por ano. Além disso, mais de 4 bilhões de pessoas foram afetadas.
Essas duas décadas causaram US$ 2,97 trilhões em perdas para a economia global. Os dados mostram que as nações mais pobres tiveram taxas de mortalidade mais de quatro vezes superiores às economias mais ricas. Em comparação, o período anterior de 20 anos, de 1980 a 1999, teve 4.212 desastres relacionados com desastres naturais. Estes eventos causaram 1,19 milhão de mortes e perdas econômicas de US$ 1,63 trilhão. Mais de 3 bilhões de pessoas foram afetadas.
Um melhor registro explica a diferença nas últimas duas décadas, mas o aumento das emergências relacionadas ao clima foi a principal razão para o crescimento. Para os autores do relatório, “esta é uma prova clara de que em um mundo onde a temperatura média global em 2019 era 1,1º C acima do período pré-industrial, os impactos estão sendo sentidos.” Segundo eles, isso é evidente na maior frequência de ondas de calor, secas, inundações, tempestades de inverno, furacões e incêndios florestais.
As inundações foram responsáveis por mais de 40% dos desastres, afetando 1,65 bilhão de pessoas, seguidas por tempestades, 28%, terremotos, 8%, e temperaturas extremas, 6%.
Esforços
Em comunicado, a representante especial do secretário-geral para Redução de Risco de Desastres, Mami Mizutori, disse que “as agências de gestão de desastres conseguiram salvar muitas vidas com uma melhor preparação e a dedicação de funcionários e voluntários.” Apesar disso, Mizutori afirmou que “as probabilidades continuam sendo adversas, em particular devido a nações industrializadas que estão falhando miseravelmente na redução das emissões de gases de efeito estufa.”
Para a representante, é “desconcertante” que as nações continuem, de forma consciente, a plantar as sementes da sua destruição, apesar da ciência e das provas de que estão transformando sua única casa em um inferno inabitável para milhões de pessoas.”
O relatório também destaca a pandemia de Covid-19, dizendo que a situação “expôs muitas deficiências na gestão de risco de desastres, apesar de avisos repetidos.”
A pesquisa recomenda ação urgente para melhor gerenciar fatores de risco, como pobreza, poluição do ar, crescimento populacional em locais perigosos, urbanização descontrolada e perda de biodiversidade. O estudo aponta riscos climáticos que se tornaram permanentes nas últimas décadas, afirmando que devem ser o foco de medidas de preparação nacional.
A mudança nos padrões de chuva, por exemplo, representa um risco para 70% da agricultura global e para 1,3 bilhão de pessoas que dependem da degradação de terras agrícolas.
Apesar destes eventos climáticos se terem tornado mais frequentes nos últimos 20 anos, apenas 93 países implementaram estratégias em nível nacional.
O mundo está a caminho de um aumento de temperatura de 3,2º C ou mais, a menos que os países industrializados consigam reduzir as emissões de gases de efeito estufa pelo menos 7,2% ao ano
O mundo está a caminho de um aumento de temperatura de 3,2º C ou mais, a menos que os países industrializados consigam reduzir as emissões de gases de efeito estufa pelo menos 7,2% ao ano
Mami Mizutori disse que a resposta a este problema “depende da liderança política acima de tudo.” Para ela, a Covid-19 “é apenas a prova mais recente de que os políticos e líderes empresariais ainda não estão em sintonia com o mundo ao seu redor.”
O relatório destaca algum sucesso na proteção de comunidades vulneráveis, graças a sistemas de alerta precoce, preparação e resposta, mas realça que aumentos da temperatura em nível global devem tornar essas melhorias obsoletas em muitos países.
Impactos climáticos
Atualmente, o mundo está a caminho de um aumento de temperatura de 3,2º C ou mais, a menos que os países industrializados consigam reduzir as emissões de gases de efeito estufa pelo menos 7,2% ao ano na próxima década. Em transmissão ao vivo promovida pela USP sobre o Clima Extremo, a professora Rachel Albrecht reforça a percepção crescente de que realmente o clima está mais descontrolado.
Todos os extremos estão acontecendo, alguns mais severos do que em outros, como no Rio Grande do Sul. Em São Paulo, por exemplo, setembro teve o registro de maior temperatura desde o início do IAG, há mais de 80 anos. “Se vocês acham que está quente, está quente mesmo”, salienta a pesquisadora. Desde meados de 1980 os recordes de temperatura e chuva vêm sendo batidos com frequência.
Um estudo da MetSul Meteorologia, no Rio Grande do Sul, feito a partir da observação de dados acumulados em 100 anos, comprova o aumento das chuvas e outros fenômenos extremos desde a década de 1990. “A gente vê fenômenos globais impactando nos níveis locais”, atesta Estael Sias, diretora da Metsul. Ela reforça com um estudo do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) já são 427 meses seguidos que a temperatura média global está acima do normal. Os 20 anos mais quentes da história do nosso planeta se concentraram nos últimos 22 anos.
Em resumo