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O cenário para os trabalhadores no futuro: 5 tendências de alto impacto

A pandemia encerra o ciclo da Revolução Industrial e as condições dos trabalhadores no futuro com a aceleração de mudanças que eram previstas para os próximos anos

Carlos Plácido Teixeira
Jornalista I Radar do Futuro

* Texto publicado originalmente em 5 de novembro de 2020

Em 2026, você ainda estará trabalhando em casa. Não aquele apartamento que você tinha em 2020, quando começou a trabalhar em regime de home office, porque a pandemia obrigou. Agora é em um “apertamento”, como você chama com alguma tristeza. Tempos bons aqueles em que você tinha um empregador para chamar de seu. Agora, praticamente ninguém tem uma única empresa que assina carteira e garante direitos, como aquelas férias que você tinha em Miami, nos Estados Unidos, que vivem o pior momento da história do que foi o maior império do planeta.

São tempos de cada um para si. Sorte a sua, pioneira no domínio de sistemas de tradução instantânea por voz, hoje comuns, conquistou clientes pelo mundo, inclusive no Vietnã, o que garante uma remuneração melhor para as suas atividades de gestora de dados.

Estamos embarcando na história deste futuro, que é quase daqui a pouco. No início destes estranhos anos, testemunhamos as mudanças aceleradas no ambiente do sistema produtivo com isolamento e home office. Acontecimentos que nos empurram para o cenário do futuro. Ao provocar a antecipação de novos modelos de funcionamento da sociedade e das atividades cotidianas, que eram esperados para até o meio da década, a pandemia nos levou a adotar parte do que será o cotidiano do nosso trabalho em 2026. Ou antes, bem antes do que imaginamos.

Constatamos, um tanto assustados, que o mundo não será o mesmo. Ninguém estava realmente preparado para tanta novidade em meio a uma crise. Uma nova realidade já em construção é marcada por saltos exponenciais de inovações. O domínio da tecnologia e mudanças sociais, econômicas e políticas estão impondo um panorama diverso do que viveram os seus pais e avós. Ajustes em competências, habilidades e atitudes diferentes serão demandados. A revolução digital vai se impondo e encerrando as revoluções industriais.

Para nos ajudar a entender e preparar para o que vem por aí no mundo do trabalho, desenvolvemos uma listas das forças centrais do futuro. São transformações (bem) possíveis que vão impactar o futuro da inserção profissional e das relações entre empregados e empregadores e a sobrevivência das pessoas. A compreensão das forças positivas e negativas será essencial para quem deseja criar oportunidades de sobrevivência no mercado. Confira abaixo:

Tecnologia ubíqua

A tecnologia é A FORÇA. Todas as atividades de sobrevivência dos humanos estarão, de algum modo, afetadas profundamente pela evolução das tecnologias e pela digitalização, o que consolida a ubiquidade como a marca do período que estamos vivendo. Das funções mais simples às mais sofisticadas. Em qualquer área de conhecimento e da prática. A revolução em atividades produtivas será resultado da combinação de internet múltiplas vezes mais veloz e dos poderes de processamento e de armazenamento das máquinas e seus sistemas. O mundo estará vivendo um momento de maturidade plena das inovações como inteligência artificial, internet das coisas, robótica, automação, impressão 3D, realidade virtual e computação cognitiva. Além da biotecnologia e nanotecnologia.

Haverá mais coisas virtuais, desmaterializadas, conectadas, inteligentes, interativas, convergentes e integradas em redes de comunicação. A pandemia provou para as empresas e para o mercado de trabalho que a tecnologia disponível, já hoje, ainda na transição da internet 4G para a 5G, já oferece condições ideais para garantir o funcionamento das organizações privadas e públicas. Daí, antes mesmo do fim do isolamento social imposto pela pandemia, uma pesquisa da Fundação Instituto de Administração (FIA), da Universidade de São Paulo, revelou que 94% das empresas brasileiras atingiram ou superaram suas expectativas de resultados com o home office.

A ubiquidade terá como efeito, primeiro, a transformação da teoria e das práticas sobre profissões, funções, trabalhos e empregos. Atividades serão alteradas, novas profissões vão surgir. As relações de trabalho serão transformadas, dando forma a sistemas de administração diferentes dos atuais. As áreas de recursos humanos, que hoje se definem como gestão de pessoas, terão de se adaptar a modalidades de contratos que podem abranger desde empregados com vínculos e direitos garantidos até contratados por horas, em lugares distantes do planeta. Além destas possibilidades, ainda haverá transformações em sistemas de produção com a inclusão da robótica e automação de processos.

Profissões mutantes

Consequência do item anterior, a revolução digital altera a compreensão sobre definições e as atividades típicas das profissões. Nas fábricas, humanos têm a companhia de robôs colaborativos. Além das grandes máquinas que substituem os operários na linha de produção. Nos escritórios, humanos convivem com assistentes virtuais. A robótica e recursos inteligentes substituindo pessoas nas indústrias e escritórios. Funções serão extintas, outras criadas e muitas das tradicionais metamorfoseadas. Viveremos, agora sim, o momento em que as profissões passam a ser descritas com novas características.

Trabalhadores incorporarão um maior número de habilidades e atribuições. Inclusive, devem ser capazes de assumir atribuições de outras funções ou profissões. Como o administrador de empresas, que será capacitado a desenvolver os seus próprios sistemas de monitoramento e análise de negócios. Na odontologia, por exemplo, a impressão 3D já será comum nos consultórios, eliminando a necessidade de laboratórios de protéticos. Ou seja, os recém-formados serão testemunhas da recombinações. Funções, habilidades, tecnologias estarão cada vez mais integradas, redirecionando a lógica atual das especialidades, que tenderão à substituição.

Funções profissionais baseadas em rotinas já serão impactadas de forma imediata, assim como aquelas com algum nível de insalubridade.  E mesmo muitas das atividades associadas a cargos gerenciais e analíticos. Por exemplo, a tecnologia vai afetar o cotidiano do médico. A inteligência artificial associada à internet das coisas fará o trabalho de diagnóstico e recomendação de tratamentos. A integração de empresas a redes inteligentes de governos – incluindo sistemas de cobrança e controle de tributos – elimina o papel do contador tradicional. Na engenharia, cálculos estruturais serão feitos com maior competência e agilidades por sistemas.

A aceleração das inovações tecnológicas vai exigir a reciclagem permanente dos profissionais. Pense da seguinte forma. Hoje, o mercado demanda a formação de condutores de drones, para o atendimento imediato de demandas do meio rural, por exemplo. Em pouco tempo, o especialista poderá ser substituído por um técnico de inteligência, capaz de programar uma máquina para tomar decisões. Situações semelhantes tendem a ser permanentes. Como efeito, a reciclagem de conhecimentos será permanente. Mas com impactos profundos na estrutura de formação de profissionais.

Produção digitalizada

Grandes indústrias, como as de automóveis, siderurgia, alimentos, eletrodomésticos, roupas e de móveis, continuarão a existir e empregar pessoas. Inclusive trabalhadores manuais. Mas bem menos do que nas revoluções industriais do passado, da mecânica. Nos tempos de nossos pais, avós e bisavós, cada nova máquina desenvolvida dependia da criação de especialistas em apertar botão, por assim dizer. Alguém precisava repor o estoque de matéria-prima ou papel para embalagem. Se um equipamento estragava, chamava-se o pessoal da manutenção. E alguém anotava os dados em planilhas.

No Brasil, fábricas que mal saíram hoje da segunda revolução industrial ainda estarão evoluindo muito lentamente. Ainda haverá convivência do velho e do novo. Nos países desenvolvidos o panorama terá mudado de forma profunda até meados da década de 2020, consolidando o conceito das indústrias 4.0. Os sistemas de produção estarão mais próximos da automação total. Quando um consumidor fecha um pedido de ervilha no supermercado virtual, o sistema já gera um pedido de reposição de estoque, encaminhado para a indústria. O fazendeiro terá condições de fazer sua previsão de plantio, utilizando os seus sistemas e os equipamentos que preparam as sementes. Tudo quase sem contato humano — human free, como dirão os consultores.

Haverá mais especialistas em desenvolvimento de softwares inteligentes, gestores de redes e analistas de bancos de dados do que operários nas fábricas. Os trabalhadores das linhas de montagem terão suas atividades acompanhadas por robôs colaborativos. Será difícil saber quem dá o ritmo na produção. Nesses ambientes dominados por robôs de diversos tipos, funções e tamanhos, as máquinas terão seus próprios sensores para diagnosticar a possibilidade de problemas e providenciar correções.

Fábricas digitalizadas transferirão a produção de peças de reposição para proprietários de impressoras 3D, impactando todos os sistemas de transporte e logística. O mercado já define o processo como “a democratização da manufatura”. Produtos impressos próximos de onde a demanda está. Com isso, os custos logísticos diminuirão significativamente, além de chegarmos ao nível de uma produção sob demanda — on demand –, na qual a “fabricação” (ou melhor, impressão) ocorre conforme as vendas são realizadas. Isso sugere que as indústrias não terão mais estoques.

Relações precarizadas

A informalidade, descentralização e desregulamentação crescente do mercado de trabalho, além do próprio avanço das tecnologias, levará ao aumento crescente das atividades em casa, o “home office”. Até por uma questão de concorrência: com abundância de concorrentes, quem tiver o menor custo sempre leva vantagem. Se hoje trabalhar em casa é uma solução para um problema, no futuro será uma necessidade para a redução de custos. A manutenção de uma sala será um luxo. Em compensação, em 2026 o acesso da internet terá dado o salto espetacular. Conversaremos com clientes, parceiros e fornecedores projetados holograficamente em nossas salas.

O mercado de trabalho tende a ser profundamente desigual em 2026. Com elevada concentração de renda e poder. Um sistema predatório, provavelmente. Hoje, a pandemia já evidencia algumas das tendências. Os impactos do novo coronavírus incluem desemprego em alta, redução de salários, perda de benefícios e o fim prematuro de carreiras, neste cenário que os especialistas em gestão profissional chamam de mundo “vuca”, de volátil, incerto, complexo e ambíguo. A informalidade deve ser a marca das relações entre demanda e oferta de atividades. As plataformas de trabalho, como o Uber atual, vão oferecer atividades temporárias para os especialistas.

Para uma minoria, a busca por modelos de negócios inovadores estará em efervescência, com a manutenção do culto ao empreendedorismo como saída para as dificuldades individuais. Economia criativa, produção compartilhada e descentralizada também estarão cumprindo a função de geração de atividades, no ambiente em que o comércio eletrônico será o destaque. Grandes empresas, especialmente as multinacionais em áreas de tecnologia, ainda estarão dando oportunidades de emprego para grupos de profissionais especializados, garantindo a ocupação de prédios de grande porte.

Crises de modelos políticos e econômicos

Os ambientes político, social e econômico estarão em processo de ebulição rumo a uma onda do pós-capitalismo. Para quem nos acusa de pessimismo, é bom avisar que o aviso tem a adesão do Fórum Econômico Mundial (WEForum), a entidade que representa o 0,1% da economia e da política do planeta. Relatórios divulgados nos últimos tempos revelam a preocupação com a expectativa de que, nos próximos anos, a sociedade global conviverá com o crescimento contínuo do desemprego e com o aprofundamento da desigualdade de renda e elevado desemprego. Além de questões climáticas e aprofundamento das disputas por água.

A ausência de resultados concretos para os problemas sociais vai reforçar a tendência de questionamento não só sobre o papel das lideranças atuais. Também toda a estrutura que envolve a administração de interesses internos e externos das populações estará sob fogo cerrado. Será o enfraquecimento da democracia representativa, assinala o WEForum. “A crescente desigualdade é mais do que um fenômeno econômico preocupante — ela consiste em um grande desafio para a humanidade”, avalia Klaus Schwab, ex-presidente do Fórum e autor do livro “A Quarta Revolução Industrial”.

A pandemia deu algum sinal de que as populações vão pressionar os seus governos para que o bem-estar social ganhe prioridade. As políticas destinadas exclusivamente ao controle de gastos públicos, a austeridade e a submissão às regras do sistema financeiro, serão paulatinamente atacadas porque terão um caráter explosivo nos próximos anos. Alguma coisa terá de ser feita. Mesmo que seja a renda básica universal, como último recurso para resolver os desafios do futuro.

Em resumo

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