Carlos Teixeira
Jornalista I Futurista
Na última hora, o brasileiro vai aderir à torcida pela seleção brasileira na Copa do Mundo de Futebol. A abertura do evento na quinta-feira, dia 14 de junho, no Estádio Luzhniki, em Moscou acendeu uma chama de curiosidade. O sistema de buscas do Google sinaliza, com o início dos jogos, o “aumento repentino” do interesse do brasileiro pela disputa entre as principais seleções do mundo.
Pouco envolvido inicialmente, o torcedor começou a procurar dados sobre o calendário e informações gerais sobre o evento. Mas não se deve esperar o mesmo carnaval de anos passados. O padrão das buscas é diferente de anos anteriores, reforçando o que já se pode perceber sem muito esforço nas ruas ou em pesquisas de opinião que apontam um desânimo do brasileiro em relação à competição. Na véspera de outras copas os índices do Google Trendes, sistema que fornece dados sobre as pesquisas realizadas pelos internauta, mostravam um comportamento de maior interesse e envolvimento dos usuários da internet.
Especialistas não têm dúvidas de que a mobilização da torcida depende exclusivamente do desempenho do time brasileiro em campo. Mas não bastará uma vitória no primeiro jogo. Ou uma passagem para o segundo turno sem convencer. Para os especialistas formais e informais do cenário esportivo, “depende do bom desempenho em todos os primeiros jogos”.
Mudança de interesses: não é de hoje
O comportamento do brasileiro diante da Copa do Mundo reflete as mudanças mais gerais de relacionamento da população com a prática esportiva, hoje, mais do que nunca, vinculada aos valores dos negócios — business. O distanciamento do público com o seu esporte preferido não é o resultado exclusivo da insatisfação com a política e com o aumento da corrupção. Nem da crise econômica que persiste preocupando a população, inclusive com o alto desemprego. Há ingressos mais caros, problemas de transporte individual e público, segurança e violência. Há também perda de identidade com o público. Além da visibilidade explosiva sobre o papel corrupto das instituições que cercam a atividade, da CBF e Fifa, até o submundo de interesses gerido pela Rede Globo.
O mercado do futebol tende a ser cada vez mais parecido com a religião católica no Brasil: quase todos se identificam como cristãos, mas poucos frequentam uma missa. E raramente seguem os dogmas. Um ecossistema religioso que convive com a expansão dos que se declarram ateus. Pesquisa recente divulgada pelo instituto de pesquisas DataFolha, no início de 2018, já anunciava que é crescente o número de brasileiros que dizem não ter interesse nenhum pelo futebol. O número evoluiu consideravelmente nos últimos oito anos.
Ou seja, há um processo de mudança de demandas do mercado em relação a uma prática que se beneficia de padrões antigos de funcionamento do mundo. Na comparação com 2010, em pesquisa semelhante do mesma DataFolha, o índice dos desinteressados pelo esporte cresceu dez pontos percentuais. O aumento de pessoas que disseram não mostrar qualquer interesse pelo esporte foi acompanhado por quedas nas porcentagens de pessoas que dizem ter grande interesse, que caiu de 32% para 26%, e de pequeno interesse, que recuou de 16% para 9%. No cenário atual, 24% dos homens não se interessam, enquanto as mulheres são 56%.
Elitização: Da “várzea-Brasil” para a Europa
Antigamente, antes da urbanização de todos os espaços urbanos, os campos de várzea , em áreas pobres das cidades, eram a fonte da revelação de talentos para os clubes de futebol. Agora, os times cumprem o papel desempenhado pelos campinhos de terra. “Acho que há sim uma contribuição do episódio do 7 a 1, mas a redução pelo interesse pelo futebol vem de um movimento anterior – a mercantilização do futebol, que começou principalmente no final da década de 1970”, avalia o historiador Aírton de Farías, em uma entrevista publicada no site O Povo. Para ele, as pessoas se afastaram dos estádios e o esporte virou uma atração de televisão”. Enquanto locutores esportivos de rádio e TV preservam as mesmas estratégias de narração de jogos que os antepassados criaram há mais de 60 anos, o futebol sofre suas mutações, como adaptação ao ambiente de negócios da indústria 4.0.
O futebol não perde vigor como espetáculo. Mas, assim como as revoluções, o show será televisionado, como “business”. Em altíssima definição de imagem, direto da Europa, para onde já convergem os jogadores brasileiros antes mesmo de uma experiência em campos do Brasil. A perda de público nos estádios e nas ruas tende a ser fato irreversível, graças à combinação de variáveis como o aumento da queda da renda e da qualidade de vida da sociedade com o maior acesso a tecnologias, cada vez mais rápidas e baratas.
A pesquisa do DataFolha realizada no início do ano demonstra que o futebol já vem deixando de ser um esporte de massa. O grupo formado pela população de baixa renda, a grande maioria da população, demonstrou o maior desinteresse pelo acompanhamento da vida de times e dos jogos. Segundo o estudo, 45% dos que têm renda de até dois salários mínimos e 37% da faixa entre dois e cinco salários estão completamente distantes do ambiente esportivo.
O futebol tende a refletir cada vez mais a concentração de renda da sociedade. Não é à toa que dos 40 clubes brasileiros que integram as Séries A e B do Brasileirão, apenas cinco podem se orgulhar de ter uma torcida fiel, que não teme adversidades, vai ao estádio e pouco se importa com a crescente irrelevância dos estaduais. As outras 35 agremiações, uma parcela de 87,5% desse montante, sofre com uma irrisória taxa de ocupação nas praças esportivas – menos de 35%. No campeonato brasileiro atual, apenas cinco times — Atlético-MG, Palmeiras, Corinthians, Paysandu e Santos — não jogam para estádios vazios. No top 40 do país, somente 10 conseguem ter uma média superior a 10 mil fãs por jogo.
Em resumo