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Quantas profissões sumiram nos últimos anos?
Apenas uma ocupação foi substituída pela automação nos EUA desde 1950
A automação costuma ser vista constantemente como uma ameaça às ocupações desempenhadas por seres humanos. Apesar da óbvia possibilidade de redução de postos de trabalhos advinda do uso cada vez maior de máquinas para desempenhar trabalhos humanos, apenas uma ocupação foi totalmente substituída pela automação nos Estados Unidos nos últimos 67 anos.
Segundo estudo publicado pelo economista de Harvard James Bessen, a ocupação em questão é a de ascensorista (operador de elevadores). Bessen chegou a essa conclusão analisando o Censo de 1950 dos Estados Unidos e comparando com dados recentes, identificando que das 270 ocupações listadas naquela época, 232 ainda existem atualmente.
Isso significa que 38 delas foram removidas, mas apenas uma foi substituída pela automação. Das outras 37, 32 não existem mais graças à redução da demanda (caso dos guardas de pensão), enquanto cinco foram superadas devido à evolução tecnológica (como os operadores de telégrafo). Em suma, a obsolescência “mata” mais profissões do que a automação.
Obsolescência “mata” mais ocupações do que a automação.
Para economista, a automação parcial pode resultar em aumento de postos de trabalho.
Automação parcial vs automação total
Ainda na avaliação de Bressen, a automação nem sempre tem um viés negativo para uma ocupação, podendo inclusive ajudar na geração de novos postos de trabalho quando ela acontece apenas de forma parcial. “Essa distinção [entre automação total ou parcial] é importante porque implica em resultados econômicos bastante diferentes”, escreveu o economista em um artigo ainda em 2016.
“Se um trabalho é completamente automatizado, então a automação necessariamente reduz o emprego. Mas se um trabalho é parcialmente automatizado, o número de empregos pode aumentar”, aponta o economista.
Isso aconteceria porque, em um cenário perfeito, a automação reduziria diretamente o preço do produto final, tornando-o mais acessível ao grande público. Com o aumento da demanda, a produção também aumentaria, o que resultaria em novos postos de emprego.
Que máquinas vão gerar empregos afinal?
rogramadores de fresadoras CNC, técnicos de mecatrónica, soldadores e engenheiros de soldadura, operadores de impressoras 3D, costureiros, especialistas em desenho assistido por computador. A lista de profissões é extensa e cada uma aplica-se, em simultâneo, a alguns dos sectores industriais com o melhor desempenho a nível nacional (como o têxtil, o calçado ou a metalurgia). Todas partilham do mesmo hipocentro: são máquinas que as fazem existir. E isto acontece no mesmo mundo que emite alertas sucessivos da substituição do homem pela máquina — o Fórum Económico Mundial prevê o desaparecimento de cinco milhões de empregos até 2020.
Talvez seja melhor não esperar que a tecnologia nos passe a perna e são cada vez mais as vozes que pedem mão de obra especializada e atualizada. “Em todo o sector industrial, as máquinas são criadoras de emprego líquido”, defende Manuel Grilo, diretor do CENFIM-Centro de Formação Profissional da Indústria Metalúrgica e Metalomecânica, que exemplifica: “Não há um profissional de metalomecânica inscrito num centro de emprego, tanto pelo crescimento do sector [alavancado pelo aumento das exportações] como pela sua modernização. O que acontece é que as novas tecnologias trouxeram um emprego diferente, muito mais qualificado.”
Uma busca rápida nos principais portais de emprego dá conta da procura quase diária de programadores e operadores de CNC (controlo numérico computorizado), que permitem “esculpir” materiais brutos, como a madeira ou o metal, transformando-os em produtos finais de áreas como o mobiliário ou a aeronáutica. O fenómeno não é exclusivo de Portugal, razão pela qual “muitas empresas francesas e holandesas vêm cá buscar estes profissionais”, descreve Manuel Grilo. No ano passado, mais de 90% das 13 mil pessoas formadas nos 13 núcleos do CENFIM (não apenas em CNC) conseguiram emprego na área em menos de seis meses.
Na unidade de Lisboa, em Xabregas, uma fresadora de cinco eixos é a coqueluche da casa. O investimento nesta máquina, de €200 mil, permite formar profissionais para atender às necessidades de muitas empresas implantadas em Portugal e no estrangeiro, ainda que, nos últimos tempos, o CENFIM não esteja a conseguir dar a resposta de que o país precisa por atrasos de financiamento. Nos casos em que não há fundos públicos envolvidos, no entanto, as formações continuam. Só que “grande parte das empresas são pequenas e médias empresas e não têm capacidade de investir na qualificação dos trabalhadores”, enquadra Manuel Grilo, que recebe cada vez mais formandos do estrangeiro.
Daqui a pouco tempo, João Gomes, aluno do CENFIM, será oficialmente especialista em programação e operação de máquinas CNC, opção que se seguiu ao mestrado na área de Engenharia Aeronáutica, porque saiu da universidade preparado “em termos de conhecimentos mas não para fazer coisas concretas”, admite. “Na universidade foi tudo muito teórico” e o horizonte, em termos de emprego na área da produção, era turvo, pelo que a atualização de conhecimentos pela via técnico-profissional trouxe-lhe maior segurança. Manuel Grilo e o jovem de 31 anos já discutem, aliás, o local de estágio após a formação, que se traduzirá muito provavelmente em emprego. O mesmo deverá acontecer aos restantes operadores.
FATOS-MACACO NO GUARDA-ROUPA
Neste adeus aos tempos modernos, monitores, teclados e joysticks substituem a alta velocidade o peso de tambores de aço e de engrenagens rudimentares nas mais diversas indústrias. Mas a imagem generalizada da fábrica continua a emergir a preto e branco — e de forma pouca apelativa — à vista das camadas mais jovens. “Se antes operar uma máquina dependia de características como a resistência e a destreza manual e física, agora as máquinas são controladas através de computadores e trabalham sozinhas”, atualiza Manuel Grilo, do CENFIM. “Já não são trabalhos fisicamente exaustivos nem sujos e requerem pessoas com altas qualificações, que são bem pagas por isso. E além do emprego garantido, aqui não existem precários”, conclui, prevendo que as diferentes indústrias cresçam em força nos próximos anos.
CRIADORES A PARTIR DO NADA
Paralelamente às técnicas de remoção, os processos aditivos ganham terreno na indústria, apesar de sofrerem do mesmo problema de falta de mão de obra especializada. Com a evolução da impressão 3D, “num futuro próximo, estima-se que só serão precisos 20% dos trabalhadores mundiais da construção civil, por isso, vamos precisar de novas competências”, assegura Francisco Aguiar, da CODI, empresa líder no comércio e design industrial com recurso a tecnologias aditivas, que produzem matéria a partir de desenhos computorizados.
“Hoje podemos construir a partir do nada. Em meia dúzia de horas, conseguimos entregar um produto a um cliente, sendo que o mercado quer o produto cada vez mais rápido e em pequenas séries”, ilustra o profissional. A “dificuldade” está em “encontrar pessoas que tenham consciência e conhecimento do processo de impressão 3D”, pelo que a CODI tem investido na “carolice” (isto é, no autodidatismo) e na colaboração com universidades que se têm iniciado em laboratórios de fabrico aditivo. Ainda assim, “não há cursos com cadeiras específicas para isto; estamos um bocadinho atrás nesse ponto”, analisa Francisco Aguiar, que acredita que em formações de design, em engenharias e na arquitetura, o ‘mundo aditivo’ deverá ser muito utilizado no futuro.
Mas que tipo de trabalho terão estes profissionais? Por um lado, existe a operação (simples) de impressoras. “Para se gerir uma plataforma com 30 a 50 impressoras, é preciso ter um operador altamente especializado que possa fazer correções e manutenção”, descreve o especialista. Por outro, requerem-se programadores aptos para trabalhar em áreas tão díspares como a saúde (para imprimir tecido humano, por exemplo) ou a construção civil (em casos como a reabilitação de edifícios).
São necessários conhecimentos de materiais e de estruturas”, prossegue o responsável. Na área do calçado desportivo, por exemplo, as grandes marcas investem milhões na tecnologia e no desenvolvimento de solas impressas. “Cada vez mais o desenvolvimento e o entendimento de novos materiais vai permitir ultrapassar barreiras que antigamente nos pareciam mais complicadas”, antevê Francisco Aguiar.
Na própria CODI, que forma profissionais nestas áreas, “o recrutamento não é fácil”. “No último ano, começam a sair mais pessoas da universidade com este bichinho, que ouviram falar, não têm experiência mas querem desenvolver trabalho na área. A tendência do futuro passa por termos pessoas com uma formação de base — como uma engenharia ou eletrotecnia — mas com competências cruzadas e em formação contínua, sobretudo profissional, em áreas distintas”, descreve o responsável.
SIMULADORES SEM SIMULACRO
Se é crescente a necessidade de especialistas hábeis para construir a partir do bruto e a partir do nada, o mercado também exige profissionais que saibam ligar as peças. Na área da soldadura, seja na parte técnica ou de engenharia, a empregabilidade aproxima-se dos 100%, segundo o Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ), que soma mais de 3000 diplomadas nos últimos 40 anos. No entanto, “calcula-se uma necessidade de mais de um milhão de soldadores até 2020 na Europa”, indica Rute Ferraz, responsável pelo departamento de formação do ISQ. Uma das razões para este défice é que “a atividade está conotada como suja e com pouco interesse; hoje os jovens querem trabalhar com computadores”, pragmatiza a engenheira. Mas, mais uma vez, também no mundo da soldadura, “as máquinas de hoje não têm nada a ver com o que eram há cinco anos” e os equipamentos de proteção e condições de trabalho tornaram-se mais sofisticados. “Muitas vezes, o trabalhador opera equipamentos através de tecnologias de realidade aumentada”, exemplifica a responsável, lançando a escada para os simuladores de soldadura recentemente adotados para as áreas de formação do ISQ. A tecnologia dirige-se a alunos sem experiência, garantido uma aprendizagem mais rápida, económica, apelativa e em maior segurança.
Será que um dia a soldadura será garantida por robôs? Rute Ferraz garante que “ainda não existe nada que substitua esta profissão”, sobretudo no caso dos procedimentos a laser (na soldadura por resistência, a automação já dá passos consistentes). “Há apenas, neste momento, instrumentos que apoiam e facilitam o trabalho”, para que de barras metálicas se façam bicicletas, janelas e aviões, ainda com um pequeno cunho artesanal.
Quem define a felicidade da geração do milênio
Os millennials em busca de identidade: adaptada à crise, geração Y se afirma no mercado
Clichês acerca do comportamento dos jovens que iniciaram a carreira neste novo milênio não se confirmam na prática
Será que os integrantes da geração do milênio, nascida entre a década de 1980 e o final dos 1990 é homogênea? Ou seja, o jovem adulto de classe média brasileira é igual ao nascido em família de baixa renda? E o brasileiro nesta faixa de idade tem as mesmas características de um europeu? E de um chinês?
Com a geração que nasceu do início da década de 1980 até o começo dos anos 2000, veio uma série de rótulos baseados em enxurradas de pesquisas quantitativas. A chamada geração Y foi retratada como uma promessa, mas também como um desafio para o mercado. Em 2020, especula-se que 35% da força de trabalho do mundo será composta por adultos crescidos nesse período.
Apesar de terem acesso ao Ensino Superior, eles estariam malpreparados e não saberiam lidar com frustrações. Seriam narcisistas e hedonistas, não aceitando hierarquias e querendo tudo de imediato, já que se acostumaram com a rapidez da internet. Precisariam de constante feedback, mudando de emprego com facilidade. Isso estaria transformando radicalmente o mercado de trabalho. Os millennials, frequentemente descritos assim, são da geração que precisaria de chefes especialmente preparados para liderá-los.
O termo millennial não surgiu nos anos 2000; há registros anteriores do uso da palavra. Publicado em 1992, o livro Generations: The History Of America¿s Future, 1584 – 2069 (em tradução literal, “Gerações: A História do Futuro dos EUA”), de William Strauss e Neil Howe, já usava a expressão para descrever a geração de norte-americanos que nasceram entre 1982 e o ano 2000. O termo pegou.
Hoje, os millennials estão crescidos. Esses jovens, os primeiros a terem o domínio total das tecnologias de consumo, atualmente vivem em um cenário pouco favorável para o início do desenvolvimento profissional, dada a crise econômica do Brasil. E o mercado de trabalho, ainda que passe por constantes transformações devido à tecnologia, continua funcionando sob processos tradicionais corporativos adquiridos há décadas.
Entender as características de um grupo tão heterogêneo é o que diversas publicações e pesquisas tentam fazer. Um exemplo: no site da Amazon americana, em uma pesquisa de livros com o termo “millennials”, mais de 4 mil resultados aparecem. O primeiro na lista descreve-se como um “guia para aprender a trabalhar com essa geração”. Outro propõe-se a preparar o leitor para um futuro “ridiculamente otimista” com os millennials no comando.
Mas as expectativas que essa geração tem em relação ao trabalho não são surpreendentes ou exageradas, diz Márcia Almström, diretora de Recursos Humanos do ManpowerGroup, empresa recrutadora de profissionais. Ela avalia que a maioria dos trabalhadores – sejam eles millennials ou não – também deseja mais tempo livre, possibilidade de crescimento e bom salário:
– A grande diferença do jovem de hoje, profissionalmente falando, é que ele traz para a pauta a ideia de fazer o que se gosta, abrindo essa discussão, já que outras gerações eram mais submissas ao modelo corporativo instituído.
Porém, a geração que foi retratada como aquela que priorizaria a qualidade de vida ao escolher um emprego rendeu-se às oito horas diárias, ou até mais. No Brasil, as pessoas entre 18 e 35 anos trabalham em média 45 horas por semana, o mesmo que os jovens dos EUA e da Noruega. Ao redor do mundo, 26% dos millennials têm mais de um emprego, segundo dados do estudo Millennial Carreers, da ManPowerGroup.
– Há quebras de paradigmas. Todo mundo fala em descomprometimento, mas, pelos números, essa geração trabalha muito, até mais do que as gerações anteriores – diz Márcia.
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Jennifer Deal, do Center for Creative Leadership, em San Diego, Califórnia, e autora do livro What Millennials Want from Work: How to Maximize Engagement in Today¿s Workforce (“O que os Millennials Querem do Trabalho: Como Maximizar o Engajamento na Força de Trabalho de Hoje”), critica o modo como a geração foi rotulada pelas pesquisas feitas até agora.
– Os millennials estariam tão imersos na tecnologia a ponto de não interagir com outras pessoas. Isso é um estereótipo comum visto nessas pesquisas. Sim, eles amam tecnologia, mas estão usando-a para interagir com os outros. É bom as pessoas ignorarem os estereótipos – alerta Jennifer.
Sidinei Rocha de Oliveira, professor da escola de Administração da UFRGS com doutorado em Mercado de Trabalho, refuta que exista uma geração Y do modo como sempre foi retratada. Do rico paulistano ao pobre do sertão nordestino, os jovens ainda têm estilos de vida demarcados por barreiras socioeconômicas. Ter acesso a um smartphone e nascer na mesma década não seriam o suficiente para inferir que os millennials têm as mesmas aspirações e comportamentos.
– A geração Y foi posta como uma corte planetária. Mas talvez não exista uma geração Y. O termo surgiu em uma revista e se tornou um conceito para pesquisas mercadológicas, não acadêmicas – sustenta Oliveira.
Pesquisador do mercado de trabalho com foco nos jovens, o professor enxerga tanto a onda de pessimismo quanto a de otimismo que se criou para esse grupo como uma maneira de controle. O que se falava sobre os millennials, afirma, nada mais era do que um reflexo da juventude – e não apenas da era em que nasceram.
– O conceito de geração Y era usado de um modo negativo, como instável. Ficava implícito que esses jovens transmitiam pouca confiança. Mas isso é próprio da juventude. Esse conceito foi uma forma de controlar esse jovem inquieto trazido pelas novas tecnologias dentro do mercado de trabalho. Essas argumentações eram muito mais midiáticas e para fins de consultoria – diz Oliveira.
O professor considera que a situação do país constitui um item importante ao avaliar como os jovens escolhem os empregos e aproveitam as oportunidades. Na época da bonança da economia, a oferta de trabalho é maior, o que faz ser mais fácil trocar de emprego ou arriscar novas empreitadas. Na crise, jovens pensam duas vezes antes de mudar.
– Essa geração cresceu durante a estabilidade econômica, viveu sempre com a democracia e enfrenta sua primeira crise agora. Viu-se uma expansão do Ensino Superior, e surgiram oportunidades de trabalho que não havia anteriormente. Quando muda esse contexto, não se vê mais essa geração Y – defende.
Empreendedores de fato?
– Nenhuma dessas pesquisas de mercado previa a recessão em que entraria o Brasil – comenta José Pastore, sociólogo e professor da USP especialista em trabalho, sobre a série de estudos que tentavam enquadrar um perfil para os millennials.
Pastore, referência no assunto mercado de trabalho, frisa que as dificuldades econômicas do país foram importantes para mudar algumas das perspectivas traçadas para a geração Y na última década. Ele explica que, com a crise, a legislação trabalhista atual favorece que as empresas busquem funcionários experientes.
– Esse é um dos entraves. O custo dos encargos sociais para contratar os mais experientes e os pouco experientes é o mesmo. As empresas que têm de contratar na recessão preferem alguém com melhor produtividade – afirma.
Nas pesquisas de Jennifer Deal, a economia é crucial para entender as oportunidades de trabalho. Para ela, a situação dos millennials é delicada por causa da interdependência entre as economias dos países, que se intensificou nos últimos 25 anos. Ou seja, crises em certos lugares afetam a estabilidade de outros.
Além disso, o ponto de partida de uma carreira é determinante para o restante dela, aponta Jennifer. Tal afirmação pode ser óbvia, mas a possibilidade de recuperar o tempo perdido é menor para quem começou a vida profissional na recessão.
– Aquela instabilidade que se atrelava ao jovem é substituída por uma procura de estabilidade. Trocar de atividade era mais fácil. Agora que a gente vive uma crise, e o discurso da crise assusta, se constrói um medo – afirma Sidinei Oliveira, da UFRGS.
Oliveira avalia que os postos de trabalho formal estão mais escassos – com exceção, talvez, dos estágios. Aqueles que ainda estão em fase de experimentação podem ter mais oportunidades, mas a cultura das empresas é, geralmente, exigir o mesmo dos estagiários e dos contratados.
– O estágio acaba sendo um emprego com contrato temporário para as empresas – pontua.
Em meio à turbulência econômica, além de procurar emprego, essa geração vê as políticas públicas de seguridade social mudando. Há uma incerteza sobre a aposentadoria, por exemplo.
– O mundo corporativo ainda vai mudar muito. Esse modelo de carreira e de carteira assinada vai diminuir. O papel de organizar e poupar será de cada um. Essa geração vai ter que trabalhar mais, isso é fato – afirma Ademar Bueno, coordenador do Laboratório de Inovação, Empreendedorismo e Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (LabIES-FGV).
Segundo dados da pesquisa do ManPowerGroup, no mundo, mais da metade dos millennials acredita que continuará trabalhando após os 65 anos. No Brasil, 10% acreditam que nunca vão se aposentar.
– É um efeito de uma transição de um Estado que cuidava e agora transfere as responsabilidades. Por isso, planejar é essencial. Os jovens já têm que pensar em como vão se aposentar – diz Oliveira.
Uma característica indiscutível dos millennials é que eles aproveitam bem as oportunidades de trabalhar em novos negócios digitais. Os influenciadores, os gerentes de redes sociais e os youtubers são exemplos disso.
– O mercado de trabalho está em evolução em termos de novas profissões por causa das tecnologias. E muitos jovens estão preenchendo essas funções. Mas o número de oportunidades é menor do que se pensava – afirma José Pastore.
Orian Kubaski, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos no Estado (ABRH-RS), diz que esse fenômeno passou a sensação de que o digital seria a saída para todos os millennials:
– Isso envolveu bastante o jovem, e parece que o mundo virou um cone digital. Não é uma verdade absoluta. São poucos os youtubers que dão certo, e os criadores de games não são todos geniais. O mundo digital não é um fim, mas um meio.
O futuro de algumas profissões também tornou-se incerto. A evolução da robótica e da inteligência artificial abre uma série de oportunidades, mas diminui funções. No Japão, por exemplo, robôs humanoides já fazem funções como cuidar idosos ou vender crédito em bancos. O Uber já faz testes com carros autônomos.
– Algumas profissões diminuirão drasticamente. Haverá de surgir outros tipos de profissões e, com isso, a dúvida de quem vai pagar a aposentadoria dessa geração – observa Ademar Bueno.
Com as mudanças, o que é essencial para a população e só pode ser feito pelos seres humanos (e não por robôs) será mais valorizado.
– Emprego não é aumentar o número de vagas na indústria. Vamos ter de começar a olhar para serviços em geral, como construção, saúde. O emprego desejado, com estabilidade, vai diminuir, mesmo que a economia volte a crescer. Os jovens podem olhar para os microambientes, para os seus bairros, voltar-se para aquilo que é essencial para a população – aposta Kubaski.
Estabilidade é meta, sim
À luz de uma cultura de startups, fomentada pelo Vale do Silício, essa geração cresceu com exemplos de sucesso. Mark Zuckerberg, o fundador do Facebook, é um deles. Mas os millennials, segundo os especialistas, ainda colocam o mundo corporativo e até o concurso público nos seus planos de carreira, diferentemente do que já previram pesquisas que constatavam que grande parte desses jovens desejava empreender.
– Em 2003, havia muitas previsões, mas ninguém imaginava o que a internet de fato mudaria. Algumas dessas previsões eram furadas, como a de que o futuro era ter uma startup. Como qualquer outra empresa, uma startup pode dar errado – opina Ademar Bueno.
Bueno e Oliveira entram em um acordo: apesar de os jovens terem em mente o empreendedorismo, ainda há uma cultura forte que os motiva a procurar a carreira pública ou empregos com carteira assinada.
– Vejo muitos alunos com direcionamento para o setor público. Quem pretende abrir uma empresa é um grupo bem específico – comenta Oliveira.
O mercado de trabalho sentiu o impacto dos millennials, mas não como imaginado no início dos anos 2000, afirma Jennifer Deal. Para ela, quem está nos cargos de liderança das organizações ainda são os baby boomers e os integrantes da geração X (nascidos a partir dos anos 1960):
– A cada geração se dizia que era aquela que ia mudar o mundo. Mas a cultura das organizações, no fundo, é muito estável.Se quiserem transformar o mercado, os millennials ainda têm muito trabalho pela frente. As corporações, de modo geral, ainda têm pessoas mais velhas no comando que reproduzem a vivência das gerações anteriores. Temos um ambiente empresarial ainda bastante autoritário e, com isso, o jovem vira um problema – opina Jennifer.
Físico paciente
Matheus Adam garante ser um profissional feliz. Formou-se em Física na UFRGS e depois completou o mestrado. Tem 28 anos e há quatro é concursado de uma empresa pública de tecnologia da Capital. Antes de passar no concurso, foi contratado como funcionário temporário na empresa.
O físico lembra que trabalhava cerca de 10 horas no início do emprego. Havia dois motivos: o quadro de funcionários era menor na época, mas ele também queria ver resultados rápidos na carreira. Queria crescer. Aprendeu na prática o que muitos especialistas afirmam que os millenials ainda não compreenderam: esperar pela sua vez.
– Talvez alguns não tenham em mente que o crescimento profissional é um processo longo. Eu me frustrei muito no começo, mas já cresci lá dentro. As coisas têm seu próprio ritmo – diz.
Há pouco tempo, recebeu uma proposta para ir para Belo Horizonte trabalhar em uma empresa privada do mesmo ramo. A situação econômica do país pesou na decisão.
– Quando recebi a proposta em Minas Gerais, essa crise me fez repensar – afirma.
Além da estabilidade do emprego, a proximidade da família também foi um elemento decisivo para permanecer em Porto Alegre.
– Já pensei em largar tudo, morar em outro lugar, ficar mais perto do mar para surfar, mas vou fazer o quê? Também já pensei em abrir meu negócio. Mas tenho um emprego bom, então sempre procuro um meio-termo.
Motoristas temporários
A rapidez do processo para trabalhar como motorista de aplicativos motivou Gabriel Carminatti e Bruno Vasques a se cadastrarem nas plataformas de transporte Uber e Cabify. O primeiro está há um ano em seu novo emprego; o outro nem completou um mês. Para ambos, Uber e Cabify são garantia de dinheiro na conta todas as semanas. Em comparação com empregos formais nas suas áreas de formação, o serviço de transporte mostrou ser mais vantajoso: possibilita uma renda sem precisar passar por longos processos seletivos.
Carminatti, 24 anos, formou-se em Administração e faz um curso de pós-graduação. Antes de completar a faculdade, saiu de um estágio em uma empresa de mídia para buscar um emprego com carteira assinada em marketing. Apesar de ter experiência de mais um ano na área, ele acredita que a exigência das corporações não é compatível com o salário ofertado:
– As empresas não têm muito tempo para investir no funcionário ou muito dinheiro para treinamentos. Querem alguém pronto.
Ele colocou em espera a carreira no marketing para juntar dinheiro dirigindo pela cidade por cerca de 50 horas por semana com o carro da família. A experiência como motorista é gratificante, mas não vale muito para o currículo, ele acredita. Em alguns meses, pretende seguir na busca de um emprego na área.
– Fazer o que se gosta nem sempre é o que dá a melhor remuneração – afirma.
A situação de Vasques é parecida. Com 27 anos, ele está no sétimo semestre da faculdade de Direito. Teve diferentes experiências na área. Estagiava em um escritório de advocacia que passou por cortes no quadro de funcionários e que o enviou de volta ao mercado. Foram quatro meses entre entrevistas e espera por ligações.
– Eu não podia me dar ao luxo nesse momento. O valor da remuneração (de um estágio) mal dá para se manter na faculdade, e a maioria das oportunidades não dá chances de crescimento – explica.
Hoje, ele pensa em empreender. Não descarta que seja na área da advocacia, mas a experiência com o aplicativo ajudou a desviar a rota da carreira. Vasques expõe o ônus do trabalho atual, como a falta de segurança para dirigir pela cidade carregando passageiros e a atual regulamentação dos aplicativos de transporte urbano, que para ele é pesado para o motorista. Já a falta de vínculo empregatício não o incomoda tanto:
– A gente não vai conseguir se aposentar, ainda mais com as novas regras. Agora eu vou pegar esse dinheiro e vou investir como eu quero.
Executiva e publicitária
Barbara Pagliarini trabalha desde os 16 anos, com carteira assinada, na empresa de transportes fundada pela família, em Canoas. Dos quatro irmãos, é a única mulher. E também a única a seguir no ramo familiar. Começou como secretária e hoje, aos 25 anos, é a cabeça da operação após a aposentadoria do pai.
– Ele me ajuda muito com a parte da mecânica, que estou aprendendo e é bem difícil de entender – afirma ela.
Barbara fez estágios em agências de publicidade e propaganda, sua área de formação, mas optou por assumir as questões administrativas do negócio que tem 10 funcionários. Desistiu de fazer um intercâmbio para dedicar-se à empresa.
– Já passou a vontade. Na época, não havia quem colocar no lugar. Não tinha como largar as contas, o financeiro da empresa. Levaria tempo para treinar alguém. Nesses períodos de crise econômica, já pensei em largar tudo para ser funcionária, não precisar ficar se preocupando o dia inteiro, afinal, tenho responsabilidade até com as famílias das pessoas que trabalham com a gente. Eu não tenho risco de ser demitida, mas a própria rotina pode ser instável – diz.
Marqueteiro empreendedor
Augusto Argenti Rocha, 31 anos, é hoje sócio de uma empresa de marketing digital na qual trabalha há nove. Cursou mais da metade da faculdade de Direito e começou Publicidade e Propaganda, mas não terminou nenhuma das duas.
Sua trajetória profissional foi construída colocando a mão na massa e apostando em metas a longo prazo. Logo que saiu da escola, já começou a trabalhar. Seus primeiros empregos foram em lojas de telefonia e empresas familiares. A carreira no marketing e na publicidade começou em 2006, quando foi contratado por uma agência de Esteio. Pelo desempenho, foram surgindo novas oportunidades e, principalmente, aquela da qual ele mais se orgulha: a de entrar para a Pmweb, um negócio que emprega cerca de 160 pessoas, a maioria jovens. Depois de liderar um processo importante para o futuro da empresa, foi convidado a ser sócio.
– Às vezes as pessoas querem ser reconhecidas no curto prazo. Talvez esperem mais do que conseguem entregar. Aprendi na carne a necessidade do tempo – conta.
Ele compara os anos na mesma empresa a uma relação amorosa: o longo envolvimento com uma empresa, desde o começo da vida profissional, foi uma escolha certeira para a sua vida, avalia. Ao empregar e trabalhar com tantos jovens, observa que há jovens dessa geração que se encaixariam no perfil típico dos millenials. Principalmente aqueles que vêm de universidades privadas.
– Quem se casa cedo não vai ter as mesmas experiências de quem fica solteiro. É uma escolha. Depois de certo tempo, as pessoas acabam sendo engolidas pela curiosidade ou pelo diferente. Existe, sim, esse perfil, de pessoas dessa geração que pulam de galho em galho, desistem fácil, mas é um recorte, um estereótipo – define.